Após suspender milhões de processos judiciais contra empresas que negociam créditos vencidos no Brasil, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) está analisando manifestações que podem levar à criação de uma jurisprudência unificada sobre a cobrança extrajudicial de dívidas com mais de cinco anos, conhecidas como prescritas. A lei vigente impede a cobrança judicial dessas dívidas, mas não especifica claramente sobre as cobranças extrajudiciais, gerando interpretações variadas na Justiça.
Nesse contexto, consumidores têm acionado o Judiciário alegando cobranças de dívidas prescritas feitas por plataformas que oferecem negociações digitais. Os processos indicam que essas cobranças ocorrem pela exposição das dívidas em consultas de consumidores. As plataformas, no entanto, afirmam que apenas informam sobre a inadimplência, sem efetuar cobrança, e que tais dívidas não influenciam o score de crédito dos consumidores. Como a cobrança judicial é inviável, essas negociações acontecem historicamente por vias extrajudiciais.
A questão ganhou destaque no ano passado, quando a 3ª Turma do STJ decidiu contra a cobrança extrajudicial de dívidas prescritas por plataformas. Este ano, o STJ complementou essa decisão, determinando que a prescrição da dívida não exige a remoção do nome do devedor das plataformas.
Mesmo assim, os processos continuaram a crescer nos tribunais, levando à suspensão dos casos. As ações contra empresas de negociação e cobrança aumentaram com a expansão e especialização do setor, que agora oferece negociação de dívidas através de plataformas digitais. Segundo o estudo do Serasa, Mapa da Inadimplência e Renegociação de Dívidas, de maio, existem 72,54 milhões de inadimplentes no Brasil, com um total de R$ 394,9 bilhões em dívidas negativadas.
Uma Interpretação Uniforme
O ministro João Otávio de Noronha, da 4ª Turma do STJ e relator do caso, selecionou três recursos para estabelecer um precedente vinculativo. Isso significa que será definida uma única interpretação para todos os processos sobre a possibilidade de cobrança extrajudicial de dívidas prescritas e a inclusão dos nomes dos devedores em plataformas de negociação ou acordo de débitos.
Os recursos selecionados são do Fundo Atlântico, da MGC Holding; da Recovery, do Itaú Unibanco; e da Ativos, do Banco do Brasil. Além disso, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) foi aceita como “amicus curiae” no processo, ou seja, um terceiro interessado que contribui com informações para o julgamento. A Serasa e a Conexis, que representa empresas de telecomunicações e conectividade, também solicitaram a inclusão como “amicus curiae”.
Um parecer do ex-vice-presidente do Banco do Brasil, José Maria Rabelo, que apoia a MGC Holdings, mostra que o Fundo Atlantis enfrentou 17 mil novas ações relacionadas a dívidas prescritas desde 2020, quando começou a usar plataformas para negociações, contra menos de 50 em 2019. Hoje, esse tipo de processo representa mais de 80% das ações movidas, enquanto anteriormente essa porcentagem era de causas que alegavam desconhecimento das dívidas.
A preocupação dos bancos, da indústria de cobrança e de empresas de serviços massificados é o impacto no custo do crédito devido à impossibilidade de negociações. Rabelo estima que a proibição de cobrança após cinco anos poderia gerar mais de 14 milhões de novas ações judiciais a cada cinco anos, considerando o número de inadimplentes em maio. Um estudo da Crediativos, plataforma de cobrança da MGC, indica uma queda significativa no percentual de devedores que quitam suas dívidas após o segundo ano de inadimplência.
com informações do Terra