Com a inflação em alta, muitas famílias estão mudando seus hábitos alimentares para conseguir manter a mesa do dia a dia. Itens básicos, como carne, café e ovos, tornaram-se artigos de luxo para uma parcela significativa da população, levando muitos a buscarem alternativas mais acessíveis, como carcaça de frango e espinha de porco.
A cozinheira Ionara de Jesus, 43 anos, moradora do Parque Santo Antônio, em São Paulo, exemplifica essa realidade. Mãe de três filhos, ela tem ajustado as compras para driblar o impacto dos preços elevados.
“A gente precisa se virar. Antes comprava feijão carioca, agora opto pelo fradinho, que é mais barato. No lugar do café, estamos aprendendo a tomar chá”, conta.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a inflação dos alimentos atingiu 7,69% em 2024, muito acima dos 1,11% registrado no ano anterior. Mesmo com uma leve desaceleração nos primeiros meses de 2025, os preços continuam pressionando o orçamento das famílias. Para aliviar essa situação, o governo federal zerou a alíquota de importação de alguns produtos essenciais, como azeite, café e açúcar.
Mudanças no carrinho de compras
Ionara, que recebe um salário mínimo mensal através de um programa municipal de assistência, precisa complementar a alimentação com doações de cestas básicas.
“Hoje, carne vermelha quase não entra mais em casa. Meus filhos chegam a passar dias se alimentando apenas com arroz e feijão”, lamenta.
Com a alta nos preços, proteínas de qualidade deram lugar a cortes mais baratos. A carcaça de frango, vendida diretamente por granjas, tem sido uma solução. “Com quatro quilos dela, faço sopa, canja e refogados. Dá para render bastante”, diz. Outra opção é o suã de porco, mistura de osso, carne e gordura, encontrado nos açougues por cerca de R$ 10 o quilo.
A advogada Léa Vidigal, especialista em direito econômico e segurança alimentar, alerta que essa mudança no consumo afeta especialmente crianças e adolescentes.
“A falta de proteínas adequadas pode comprometer o desenvolvimento infantil. A desigualdade social se reflete diretamente na qualidade da alimentação”, explica.
Inflação pesa no bolso das famílias
Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontam que, em janeiro de 2025, o custo da cesta básica em São Paulo chegou a R$ 851, consumindo 56% de um salário mínimo. Para suprir adequadamente uma família de quatro pessoas, o Dieese estima que o rendimento ideal deveria ser de R$ 7.156 mensais.
Enquanto os preços continuam subindo, a criatividade na cozinha se torna uma ferramenta essencial para muitas famílias. “A gente se adapta, mas é difícil ver que algumas coisas que eram comuns na nossa mesa agora são luxo”, reflete Ionara, que segue reinventando as refeições para garantir que nada falte em casa.
com informações da Folha de S. Paulo