Ela é considerada perigosa. Tem uma fórmula fixa de texto que, se obedecida de ponta a ponta, pode ser a chave do sucesso. Introdução, uma boa dose de argumentos e, para encerrar, proposta para solucionar o tema abordado. Redação, a prova mais esperada do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), é também decisiva. Ir bem ou mal é praticamente garantir ou não o salvo-conduto para a universidade. É sempre grande a expectativa pelo assunto pedido no teste e, neste domingo, não será diferente. Aplicada no primeiro dia da avaliação, a principal exigência da produção de texto é o candidato estar atento ao mundo – habilidade que permite escrever e discorrer sobre qualquer proposição do enunciado.
A supervisora de redação do colégio, Ana Paula Cordeiro Lacerda Franco, destaca que a escrita diária permite aos candidatos treinar e dominar as cinco competências: domínio da norma culta da língua portuguesa; entendimento do gênero; conhecimento do tema e dos mecanismos de conhecimento do mundo; conhecimento dos mecanismos linguísticos para construir a argumentação; e fazer uma proposta de intervenção para o problema, respeitando os direitos humanos. “O aluno traz o problema, discute sobre ele, argumenta e, no fim, propõe. Não é resolver o problema, mas o que fazer para minimizá-lo”, adverte.
Cada uma das competências vale 200 pontos, totalizando os 1 mil pontos da prova de redação. “A prova se tornou uma fórmula e tem se preocupado cada vez mais em avaliar o candidato de maneira rigorosa. A escrita formal é a competência em que os alunos têm mais dificuldade e a prova está muito criteriosa nesse sentido. A norma culta interfere em todas as outras competências, pois, quando não é articulada corretamente, o sentido da frase e do texto pode mudar.”
Segundo Ana Paula, é importante o aluno ler o manual do candidato do Enem com muito cuidado para entender na íntegra como funciona. E, nesses últimos dias, o essencial é manter a tranquilidade. “O que dava para ser feito já foi feito. Agora, é reler os textos redigidos ao longo do ano, prestando atenção nas falhas, esquematizar os possíveis temas e reler um dia antes para dar tudo certo”, avisa. “O candidato tem que estar muito preparado, porque há fatores biológicos que podem influenciar. É preciso estar tranquilo, caso contrário, não consegue raciocinar”, ressalta.
Aluno do 3º ano do Coleguium, Pedro César Bastos Moreira, de 17 anos, vai fazer o Enem e também tentar os vestibulares do ITA e da Fuvest. Ao longo do ano, conta, ele priorizou a pesquisa de temas. Durante duas ou três horas, procurava informações sobre determinado assunto na internet, em livros e nas aulas, para depois fazer um grande esquema, selecionar os pontos principais e produzir o rascunho do texto. Com o texto corrigido em mãos, ele aproveita para ver o que deveria ter feito e pontos que deixou de abordar. “É importante ter conhecimento do mundo para a prova de redação”, diz.
Na reta final, Pedro se dedica a revisar os assuntos, tentando enxergar alguma brecha em que faltou passar o olho. “Podemos ir muito bem ou muito mal na redação, dependendo da preparação”, afirma. Como treineiro nos dois anos anteriores, cravou boa pontuação, mas considera ter potencial para melhorar com aos estudos deste ano. Para ele, não adianta perder tempo com cogitações neste momento: “Não estou apostando em tema algum. Tento abordar todos nas minhas revisões. O importante é estar preparado para escrever sobre qualquer assunto”.
Repertório no centro das atenções
Para a professora de língua portuguesa do Colégio Unimaster, no Bairro Buritis (Região Oeste de BH), Monika Nascimento dos Santos, é preciso ficar atento ao repertório linguístico legitimado e produtivo. Isso quer dizer que não adianta o aluno pôr uma situação no texto e trazer os dados se não legitimar, ou seja, dizer de onde está tirando aquela informação. Já ser produtivo significa usar o argumento em prol da problematização. “O candidato tem que atentar, já na introdução, em pôr as palavras que estão no tema da redação e pensar na tese, na problematização. Num repertório produtivo, tem que usar argumentações ou citação para sustentar a introdução”, explica a professora, que é doutora em linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Entender o que está sendo pedido é outra chave, para não correr o risco de desvio ou fuga do tema – por isso, ressalta Monika, é tão importante escrever as palavras do tema. “Todo o conhecimento obtido durante a educação básica, seja na literatura, sociologia ou filosofia, deve ser usado na prova, para mostrar o projeto de autoria, quando o aluno sai do texto motivador, feito para iluminar o candidato, e se conectar ao tema”, diz. Na conclusão, não se pode deixar de apresentar uma proposta, mesmo que hipoteticamente, mostrando que o que foi escrito na redação pode ter uma intervenção, desde que não fira os direitos humanos, para solucionar ou amenizar o que o Enem está pedindo.
A professora diz que apostar num tema está difícil, dada a variedade de possibilidades. Para ela está muito visível temas relacionados aos desafios para o combate à discriminação pela linguagem. “Fake news está batido e falam também muito de adoção”, comenta. Mas, independentemente do que seja, um ponto é certo: “O aluno tem que ter compreensão cultural, social e política. Se sabe essas três áreas consegue fazer qualquer redação do Enem”.
Com Estado De Minas