Como é comum todos os anos, o tópico da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) gera amplo debate em todo o país. No primeiro dia de provas do Enem 2023, que aconteceu no último domingo (5), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou o tema do ensaio dissertativo exigido no exame: “Desafios para enfrentar a invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pelas mulheres no Brasil”.
Conforme os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua de 2022, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres dedicam, em média, 21,3 horas por semana a tarefas domésticas e ao cuidado de pessoas, enquanto os homens empregam, em média, 11,7 horas para essas atividades. Ao analisar a distribuição do trabalho doméstico entre as mulheres, a pesquisa revela que as mulheres pretas têm a maior taxa de execução dessas tarefas (92,7%), superando as mulheres pardas (91,9%) e brancas (90,5%).
De acordo com especialistas entrevistados, essa situação representa um ônus excessivo para as mulheres, especialmente as de origem negra, gerando obstáculos para sua entrada no mercado de trabalho em igualdade de condições. Além disso, impõe desafios para a participação delas na esfera pública e em outros âmbitos sociais ainda predominantemente dominados por homens.
“É uma realidade muitas vezes negligenciada, onde há uma aceitação natural de que a responsabilidade pelo cuidado das pessoas é uma atribuição das mulheres, como se fosse uma característica inerente à feminilidade. Isso está relacionado à maneira como as responsabilidades de gênero são estruturadas na sociedade, afetando a provisão de recursos e sobrecarregando as famílias”, destaca a socióloga Laís Abramo, secretária nacional de Cuidados e Família, órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento Social, Família e Combate à Fome.
Para Abramo, que lidera um grupo de trabalho (GT) encarregado de desenvolver a Política Nacional de Cuidados, a inclusão desse tema na redação do Enem é de extrema importância. “Reconhecemos a relevância desse teste para a democratização do acesso ao ensino superior e entendemos que todos os tópicos propostos na redação são oportunidades para reflexão. Ao tomar conhecimento disso, fiquei bastante satisfeita”, comentou em entrevista à Agência Brasil.
De acordo com especialistas entrevistados pela reportagem, essa situação representa um ônus excessivo para as mulheres, especialmente as de origem negra, gerando obstáculos para sua entrada no mercado de trabalho em igualdade de condições. Além disso, impõe desafios para a participação delas na esfera pública e em outros âmbitos sociais ainda predominantemente dominados por homens.
“É uma realidade muitas vezes negligenciada, onde há uma aceitação natural de que a responsabilidade pelo cuidado das pessoas é uma atribuição das mulheres, como se fosse uma característica inerente à feminilidade. Isso está relacionado à maneira como as responsabilidades de gênero são estruturadas na sociedade, afetando a provisão de recursos e sobrecarregando as famílias”, destaca a socióloga Laís Abramo (imagem), secretária nacional de Cuidados e Família, órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento Social, Família e Combate à Fome.
Para Abramo, que lidera um grupo de trabalho (GT) encarregado de desenvolver a Política Nacional de Cuidados, a inclusão desse tema na redação do Enem é de extrema importância. “Reconhecemos a relevância desse teste para a democratização do acesso ao ensino superior e entendemos que todos os tópicos propostos na redação são oportunidades para reflexão. Ao tomar conhecimento disso, fiquei bastante satisfeita”, comentou em entrevista à Agência Brasil.
Referências internacionais
A retomada das políticas sociais por igualdade de gênero no país, que foram descontinuadas nos últimos anos, também busca colocar o Brasil no patamar de outros países latino-americanos que avançaram nos últimos anos. Um decreto editado pelo governo argentino, em 2021, passou a reconhecer o cuidado materno como tempo de serviço considerado para a concessão de aposentadoria.
“Estamos, desde o começo dessa discussão, olhando muito para as experiências internacionais. Existem vários países da América Latina que estão mais avançados na estruturação de políticas nacionais de cuidado”, aponta.
Laís Abramo cita uma experiência de Bogotá, capital da Colômbia, que instituiu os chamados Quarteirões do Cuidado, que são equipamentos públicos como lavanderias coletivas, cozinhas solidárias e restaurantes populares concentrados em um raio territorial pequeno, como forma mitigar o tempo e o esforço do trabalho de cuidado.
No Brasil, a secretária nacional de Cuidados e Famílias destaca, por exemplo, o pagamento adicional de R$ 150 aos beneficiários do programa Bolsa Família com crianças até 6 anos de idade, que foi instituído em março. “O cuidado é um direito humano. Todas as pessoas precisam de cuidado. E a gente entende que o cuidado é um trabalho, que implica muitas horas diárias ao longo da vida inteira. Você não pode fazer com que a provisão desse cuidado recaia sobre as mulheres de maneira não remunerada”, argumenta Laís Abramo.
Na próxima quarta-feira (8), em Brasília, o governo federal vai sediar um seminário internacional, envolvendo altas autoridades da área de assistência social dos países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), justamente para debater o fortalecimento de políticas públicas sobre o cuidado. O evento ocorre no contexto da presidência temporária do Brasil à frente do bloco regional sul-americano.
Propostas em debate
Dentro das discussões conduzidas pelo grupo de trabalho (GT) estabelecido pelo governo federal, uma das propostas em consideração é a ampliação do período de licença-maternidade para mães que não estão ativas no mercado de trabalho. Os especialistas consideram insuficiente o período de licença-paternidade atual, que se limita a apenas 5 dias para trabalhadores com registro em carteira. Além disso, está em análise a ideia de estabelecer uma licença-parental, um período de afastamento a ser compartilhado entre os pais ou os responsáveis legais da criança.
Outras metas educacionais também são consideradas relevantes para reduzir o impacto desse trabalho não remunerado, como a meta de aumentar o acesso a creches para 50% das crianças de 0 a 3 anos. Atualmente, essa cobertura está em 35%. A expansão do ensino em tempo integral desde o Ensino Fundamental também é vista como uma medida crucial para evitar que as mulheres tenham que sacrificar suas carreiras ou empregos para cuidar dos filhos durante os períodos em que não estão na escola.
Ismália Afonso destaca que enfrentar esse desafio demanda uma variedade de medidas, inclusive a necessidade de um novo pacto social. “Precisamos atuar tanto na esfera das políticas públicas quanto na construção de um novo consenso social, abordando as questões de quem desempenha determinados papéis nas famílias, no trabalho não remunerado e na estrutura social que distribui de maneira desigual os poderes entre homens e mulheres”, enfatiza.
Da Redação com Agência Brasil