Tudo começou com um sonho. Um daqueles sonhos que acendem o coração e preenchem a mente com planos grandiosos: fazer a diferença. Mudar o mundo, uma mente de cada vez, inspirar, guiar. O início da jornada de ser professor é repleto de idealismo, de uma visão romântica sobre a sala de aula. Imaginei que o caminho seria difícil, mas nunca poderia prever o quanto a realidade seria mais desafiadora do que eu pensava.
Logo no início, a dureza do cotidiano bateu à porta. A ilusão de que bastava apenas querer ensinar se desfez diante da complexidade de ser não apenas um educador, mas um ser humano em evolução constante. Para ensinar de verdade, percebi que era necessário primeiro aprender a ser. Aprender a ouvir, a entender o outro, a olhar para além das palavras ditas e ver o que estava nas entrelinhas dos olhares e gestos. Eu precisava evoluir como pessoa, antes de ser o modelo que os alunos buscavam.
“A maior lição que a sala de aula me ensinou, contudo, foi aprender a aprender.”
Mas com os desafios vieram também os momentos de alegria. O carinho inesperado, o “obrigado, professor” sincero, os bilhetes carinhosos deixados sobre a mesa. É nesses momentos que o coração se aquece, que as dúvidas se acalmam, e que as certezas se renovam. O reconhecimento dos alunos é um combustível poderoso, mas também é inevitável sentir a tristeza das despedidas. Afinal, amizades se formam, mas o ciclo da vida nos afasta. Eles seguem seus caminhos, e nós ficamos com as lembranças de cada sorriso, de cada história compartilhada.
A maior lição que a sala de aula me ensinou, contudo, foi aprender a aprender. O prazer em descobrir que nunca sabemos tudo, que sempre há algo novo para nos desafiar, para nos fazer questionar. E então veio o choque: a transição da rede privada para a pública. Entrar nesse universo foi como mergulhar em uma realidade paralela, onde os sonhos esbarram em muros invisíveis. Descobri que a educação pública carrega em si um sistema falho, um sistema que aprisiona tantos alunos brilhantes em um ciclo de desilusão.
“Descobri que a educação pública carrega em si um sistema falho, um sistema que aprisiona tantos alunos brilhantes em um ciclo de desilusão.”
O mais doloroso foi perceber o descaso. Não de todos, claro, mas de muitos professores que, esgotados por um sistema que os sufocava, desistiram de tentar. Era um contraste gritante com o idealismo que me trouxe até ali. Ver alunos com tanto potencial aprisionados em uma estrutura falha era de partir o coração. Faltavam recursos básicos, como livros didáticos atualizados e laboratórios equipados, limitando as oportunidades de aprendizado, é uma desilusão que marca. E como se não bastasse, sempre há a resistência. Tentar introduzir ideias novas, métodos diferentes, esbarra muitas vezes em muros de conservadorismo e medo de mudança. A inovação se torna um desafio duplo: ensinar e convencer.
Mesmo assim, sempre volto ao ponto de partida. Ao sonho. Não o mesmo sonho ingênuo de salvar o mundo, mas o de fazer o meu papel dentro dos meus limites. Entender que o impacto que tenho não será em grande escala, mas que em cada aluno, posso deixar uma marca, mesmo que pequena. E isso já é o suficiente para continuar.
“O sonho de fazer a diferença continua vivo, apesar dos golpes da realidade. Porque ser professor é isso: equilibrar o amor pelo que fazemos com a resiliência necessária para enfrentar os dias difíceis”
No fim, o carinho dos alunos é o que me mantém firme. É a força motriz que me empurra em cada dia difícil, que me faz levantar mesmo quando a exaustão toma conta. Cada aluno tem uma história, uma realidade única. Minha missão é entendê-los, acolhê-los, e, na medida do possível, ajudá-los a escrever suas próprias histórias. E assim, o amor pela profissão segue firme, mesmo quando testado pelos desafios diários.
O sonho de fazer a diferença continua vivo, apesar dos golpes da realidade. Porque ser professor é isso: equilibrar o amor pelo que fazemos com a resiliência necessária para enfrentar os dias difíceis. É um ofício que exige coração, mente e alma. E, por mais desgastante que seja, é uma escolha que eu faria de novo. Sempre.
Rafael Pereira da Silva Botelho Monteiro é um professor de Letras com vasta experiência em sala de aula. Desde os 18 anos, dedica-se a ensinar, tendo atuado em diversas instituições de ensino, incluindo escolas de idiomas e pré-vestibulares com alunos de diferentes idades e níveis. Atualmente, como professor da rede estadual mineira, leciona inglês na Escola Estadual Ápio Solon, em Sete Lagoas.