No dia 12 de janeiro deste ano, Rosana Ribeiro partia para a eternidade, no Hospital Municipal de Sete Lagoas – horas mais tarde, há cerca de 60 km dali, se iniciava a corrida pela sobrevivência de um paciente grave que aguardava por um fígado no Hospital Felício Rocho, especializado em transplante de órgãos em Minas Gerais. E assim se escrevia mais um capítulo da história de quem sempre serviu ao próximo, agora depois da vida.
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Pioneira na cidade na área de podologia, Rosana tinha mais de 20 anos de atuação na área. Além de compartilhar seu conhecimento através de palestras e simpósios pelo país afora, sendo também professora do primeiro curso de podologia na cidade na Facsete, onde permaneceu até o fim. “Ela adorava dar aulas e sempre comentava sobre suas queridas alunas e o quanto estavam aprendendo. Também adorava conversar com seus clientes, às vezes durante horas de atendimento, sempre com histórias e risadas contagiantes”, diz o filho, Paulo Victor.
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Mas, para além do trabalho, a sua presença também foi marcante nas ações sociais. Rosana também foi fundadora da associação de podólogos do estado e do Observatório Social de Sete Lagoas, sendo também presidente. Sua vontade de promover mudanças sociais e políticas era constante.
“Mesmo trabalhando muito e cuidando da família, ela sempre encontrava um jeito de também se dedicar aos outros. Participou de vários projetos sociais e ajudava muitas pessoas por conta própria, angariando doações de diversos tipos, como roupas, alimentos e materiais escolares para crianças carentes. É incrível o legado que ela deixou na cidade”.
Em 10 de janeiro deste ano, a podóloga sofreu um mal súbito: um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico. Socorrida pelo SAMU e Corpo de Bombeiros, Rosana foi encaminhada diretamente para o Hospital Municipal. Foram dois dias internada, até seu falecimento.
Na noite do dia 13 de janeiro, uma mulher manda mensagem para o Instagram do SeteLagoas.com.br, relatando que seu pai, de 67 anos, tinha acabado de receber um fígado de um paciente oriundo de Sete Lagoas. Ela pedia ajuda para saber quem era a família daquele doador que deu esperanças para que a vida dele pudesse continuar.
A paciente doadora foi Rosana Ribeiro.
Ela teve morte cerebral – apesar de não ser declarada doadora de órgãos, ela falava da importância do ato. Foram os rins, córneas, além do fígado dela foram postos na fila de transplantes, sendo a primeira paciente de Sete Lagoas neste ano. “Eu sempre vi a doação de órgãos como um ato de solidariedade e empatia, uma forma de dar uma segunda chance de vida para alguém”, conta Paulo Vitor. Foi no Hospital Municipal, conversando com os médicos que cuidaram de sua mãe, que ele descobriu a importância de ser doador de órgãos.
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Foram dias que a equipe do portal buscou saber mais sobre quem era a pessoa responsável pela doação de órgãos. Por lei, os órgãos reguladores não podem repassar informações detalhadas sobre os transplantes. Porém, em cruzamento de dados, chegou-se em Rosana. Após alguns dias, a família do senhor que recebeu o fígado conversou com o filho da podóloga.
“Recebemos uma ligação emocionante da filha deste homem que estava entre a vida e a morte em um hospital de Belo Horizonte, aguardando um doador de fígado. Ela entrou em contato para agradecer, pois esse gesto salvou a vida de seu pai, que estava em estado grave e precisava urgentemente de um transplante. Foi uma conversa comovente e, apesar de ter ocorrido em um momento difícil, foi gratificante saber que uma vida foi salva graças à doação de órgãos. Além disso, outras pessoas receberam outros órgãos, mas ainda não conseguimos saber, o importante é que vidas foram salvas”, comenta Paulo.
A mulher que durante toda a sua vida lutou pela formação e educação dos filhos, além de lutar pela justiça social e o bem-estar de muitas pessoas, conseguiu ser solidária até o fim da vida: “Apesar de todas as dificuldades da vida, ela foi resiliente e nunca desistiu de seus sonhos”, diz Paulo.
Como seu último desejo, as cinzas de Rosana serão depositadas juntos com sementes de ipê branco neste sábado (22) na Serra do Cipó. Amante do lugar, ela sonhava em ter uma casa na região, mas não pôde realizar este sonho. “Nossa mãe cumpriu sua missão e construiu uma linda história de vida, regada por muito amor e solidariedade”, completam Paulo e Pedro Henrique, filhos.
4.017 pessoas aguardam por um transplante de órgão em Minas Gerais, sendo a maioria delas por um rim (3.826). No ano passado, o estado realizou 1.078 operações do tipo. Para ser doador, não é necessário deixar o pedido escrito, apenas avisar a família sobre o desejo.
“Gostaríamos de deixar um agradecimento especial pelo excelente atendimento que ela recebeu no Hospital Municipal de Sete Lagoas. Os profissionais da saúde se dedicam a salvar vidas todos os dias, e somos imensamente gratos por todo o cuidado e atenção dados a ela. Gratidão!”, comentam Paulo e Pedro Henrique.
Esta reportagem é uma homenagem a Rosana Ribeiro e ao pai de Kely Lima Faltskog, que recebeu o transplante de fígado