O Exame Nacional do Ensino Médio- Enem 2015, aconteceu no último final de semana e foi visto por muitos alunos e professores como o mais difícil dos últimos tempos. A valorização da mulher na sociedade que esteve presente tanto no sábado (24) quanto no domingo (25), gerou polêmica e diversos comentários nas redes sociais. Apesar do nível elevado de questões de ciências da natureza e matemática, o tempo e a disposição das provas foi apontado pelos alunos como os maiores vilões do Enem.
O site SeteLagoas.com.br conversou com professores e alunos do cursinho Cedae para saber o que eles acharam das provas. Os alunos Castilho Quirino e Guilherme Rodrigues estão tentando vaga no curso de medicina e já realizaram o exame em anos anteriores. Eles afirmaram que de todos que fizeram este foi o mais difícil e que o tempo continua sendo um problema.
“O tempo é muito apertado, você faz o máximo possível para conseguir fazer a prova inteira. Como são questões específicas exige um nível maior de raciocínio do aluno, isso requer mais tempo. O nível estava elevado principalmente em ciências da natureza e química”, afirmou Castilho.
Segundo Guilherme certas questões demandavam muito mais do que é visto no ensino médio público. “Algumas exigiam conhecimento específico que muitas vezes passa batido, ou não são vistos na escola. Eu vim de escola pública e sei como é difícil, a questão de trigonometria, por exemplo, foi um conteúdo que só vi no cursinho.”
A prova de matemática também foi um problema para Guilherme, “pelo nível das questões não dá tempo, principalmente em matemática. Tinha que fazer muitas continhas e com o tempo que disponibilizam não consegui finalizar a prova.”
Uma alternativa sugerida pelos meninos é não deixar para o mesmo dia Matemática, Linguagens e Redação. “Deveriam aumentar um dia ou conciliar melhor as provas, porque colocar as três piores para o mesmo dia é uma demanda muito grande para o aluno”, sugeriu Castilho.
O tema da redação foi visto com pertinente pelos alunos. “Caiu em uma semana bem conveniente, no Congresso está tendo pautas sobre o estupro, também tem o caso da menina do Master Chefe”, lembrou Guilherme.
“Foi um tema muito válido que englobou várias coisas em torno do feminismo. Isso foi muito importante para desenvolver discussões no Brasil, acho que os problemas são resolvidos com discussões”, explicou Castilho.
Veja o que os professores falaram:
Ciências Humanas
“É como se todos os diaS a gente fosse a um ambiente e já conhecesse praticamente tudo. Depois de passar um tempo sem ir, um belo dia você chega lá e está tudo diferente.” Essa foi a definição do Enem 2015 para o professor de filosofia Marcos Paulo.
De acordo com o professor a prova cobrou conteúdo, mas não fugiu do seu caráter de contexto. Foi uma prova que exigiu muito mais interpretação e subsídio técnico, um conhecimento aprofundado para resolver as questões.
A prova seguiu uma tendência que é o aumento de questões voltadas para o cunho social. Ela procurou discutir o cotidiano social do brasileiro, com muitas questões voltadas para as relações sociais.
O professor achou determinante o número de questões de filosofia e sociologia. “Foi uma prova muito voltada a questão da diversidade social, política e principalmente filosófica”, explicou.
Sobre a citação da filósofa francesa Simone de Beauvoir e a redação, Marcos Paulo comemorou o tema que “gerou certa polêmica na sociedade, onde na redação o mais machista possível teria que fazer uma defesa ao lugar da mulher na sociedade. Principalmente porque temos dados alarmantes da violência doméstica contra a mulher, que é algo alarmante e passa despercebida pela grande massa.”
Química
“Com o novo Enem, desde 2009 a prova de química vem apresentando uma dificuldade muito grande. De acordo com o professor de química Alexsandro Araújo, este ano o exame apresentou o maior grau de dificuldade de todos.
“É uma prova que está cobrando muito conteúdo, não dá mais para aluno só ler enunciado e achar que vai conseguir a resposta, ele tem que ter conteúdo na prova de química”, explicou.
Segundo o professor, o problema da prova de química do Enem é que a maioria das questões são feitas por professores universitários que não trabalham na educação básica. “Eles não sabem como funciona e com isso colocam questões de conteúdo muito puxado, e o aluno para fazer teria que ter uma bagagem muito grande.”
“Aluno de escola pública com exceção de colégios militares e institutos federais, coluni e cefet, teriam muita difuculdade para fazer esssa prova. Primeiro pela carga horária que é bem diferente das escolas particulares. Além disso, os livros didáticos que o MEC aprova para o aluno de escola pública na sua maioria não dão suporte bom. O MEC cobra uma coisa das escolas, mas na hora de aplicar sua prova anual ele cobra totalmente diferente.”
Alexsandro pontuou que um dos conteúdos mais extensos do Enem é química, mas tudo estava no edital. “A mudança está no aprofundamento que é muito maior. Eu diria que foi uma prova da Fuvest mal elaborada”, finalizou.
História
Segundo o professor Julio Romaniuk, a prova de História respeitou uma convencionalidade e não foi considerada uma vilã. A História interpretativa esteve presente, sem abandono da história factual e os textos não foram grandes.
As questões foram medianas e exigiram conhecimento prévio sobre o assunto e boa capacidade de interpretação. Júlio enfatizou que alguns temas são recorrentes como Primeiro e Segundo Reinado, o sempre eterno Getúlio Vargas, Ditadura Militar e Grécia.
De acordo com o professor a única questão que gerou dúvidas em seus colegas foi a número 24 da prova branca que falava sobre escravidão. “Os gabaritos extraoficiais marcaram a alternativa C e eu não concordei, inclusive conversei com amigos que afirmaram ser a C. Quando o gabarito oficial saiu eu vi que era a alternativa que eu tinha marcado.”
Sobre o assunto de ser o Enem mais difícil dos últimos tempos, Julio comentou que a prova de 2013 foi muito mais complicada, “ela fugia completamente do que foi proposto. Este ano não. As questões clássicas não deixaram de cair, talvez tenha surpreendido por ter aparecido uma quantidade maior de questões sobre a Idade Média.
Redação
“A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira” foi o tema de redação e provocou polêmica. Um dia antes, a prova de Ciências Humanas já havia causado diversas reações com uma questão sobre feminismo. De acordo com a professora Rozangela de Cássia, a proposta é democrática, de fácil abordagem e sinaliza a importância de tratar o assunto.
No primeiro dia da prova uma questão que falava sobre o feminismo com o texto da filósofa francesa Simone de Beauvoir, já iniciava a discussão. Os deputados federais Jair Bolsonaro (PP-RJ) e Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) criticaram a questão acusando o governo de doutrinador. Feliciano afirmou, em uma rede social, que essa era uma tentativa de “impingir a teoria de gênero goela abaixo”.
Logo após a divulgação do tema feita pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), diversos internautas opinaram sobre o assunto.
A professora afirmou que os únicos posicionamentos que viu sobre o tema foram positivos, e que apesar do assunto ser de fácil abordagem alguns alunos podem acabar seguindo os caminhos fáceis. “A tendência é repetir os dados da prova, poucos iriam adaptá-los”, afirmou.
Outro ponto negativo na visão de Rozângela é o uso do senso comum ou os argumentos previsíveis. “O grande diferencial são os alunos que trazem algo novo, é o que chamamos de argumentação consistente.”
Por Cristiane Cândido