Os cerca de 180 funcionários da siderúrgica Barão de Mauá, localizada no bairro São João, em Sete Lagoas, estão vivendo semanas de incertezas e indefinição. Isso porque desde meados de novembro de 2019, os colaboradores não sabem quem está à frente da empresa, que de lá para cá vem tendo sua situação cada vez mais deteriorada.
Quem trabalha no local reclama da falta de itens básicos, como água potável e papel higiênico nos banheiros. “A gente não está tendo voz. Parece que a gente foi esquecido lá e ninguém mais falou nada. Enquanto isso, tem 180 pessoas lá dentro, então está chegando um ponto que ninguém pode falar nada com ninguém, porque na verdade não tem liderança, não tem diretoria, não tem nada. Então cada um está vivendo lá dentro do jeito que quer”, comentou um deles, que não quis ter a sua identidade revelada.
Veja abaixo dois vídeos enviados à redação do SeteLagoas que mostram as condições dentro da empresa:
Conflitos internos têm acontecido devido ao desencontro de informações e ao não pagamento, segundo funcionários, do adiantamento que deveria ter sido quitado no dia 20 deste mês. Outra questão que também tem gerado descontentamento é a dívida referente à segunda parcela do 13º salário, que deveria ter sido paga até 20 de dezembro de 2019. “Está chegando numa situação que eu acho que só vai aparecer alguém quando acontecer um crime lá dentro”, explicou temerosa uma funcionária.
Segundo ela, já existem pessoas passando por necessidades financeiras. “Tem pessoas lá que pagam aluguel, que pagam água, que pagam pensão… Então, assim, esse pessoal está chegando num ponto de entrar em desespero, e 180 pessoas entrando em desespero não vai dar nada de bom”, projeta.
Risco de acidentes
“Mesmo que esteja parada, existe o risco de acidente lá dentro. Como não tem ninguém monitorando isso mais, porque nem o técnico de segurança lá não consegue falar nada, pode ser que aconteça um acidente lá”, comenta a funcionária, que ainda diz que o risco foi atestado por um engenheiro de segurança.
Uma ideia, inclusive, teria sido proposta durante uma reunião a fim de deixar que os funcionários ficassem em suas casas para que os possíveis acidentes de trabalho pudessem ser evitados. Mas, segundo informações, a sugestão não foi aceita.
Ameaças
Motivadas por dívidas da siderúrgica, funcionários relatam que já sofreram ameaças por parte de fornecedores da empresa. “A gente tem medo de fornecedores que a empresa está devendo. O medo é de fornecedores invadirem lá, de fazer alguma coisa. A gente não sabe a cabeça de ninguém, está todo mundo tomando prejuízo”, desabafa a funcionária.
Ainda segundo os relatos, já houve ameaças de pessoas com a intenção de atear fogo aos carros da empresa e até mesmo de fornecedores com intenção de ir até a casa de um dos colaboradores. “Esse tipo de coisa fugiu do controle da empresa”, opina.
Expectativa dos funcionários
Os colaboradores da siderúrgica alegam que estão sem informações sobre os rumos da empresa e esperam ansiosos por uma resolução da questão.
De acordo com um dos funcionários, que não quis ser identificado, apesar de não haver trabalho na siderúrgica, devido ao forno estar paralisado, todos são obrigados a comparecer e bater o ponto, já que, do contrário, multas contratuais podem ocorrer em decorrência de abandono do posto. “A gente está pagando para trabalhar, a gente é obrigado a ir, porque senão perde o direito ou então é descontado”, conta. “A gente está sem vale transporte, porque os vales não foram pagos este mês, e o pessoal está tirando isso do bolso. Então tem gente que está deixando de comer para pagar passagem para poder não perder os direitos”, relata um deles.
Eles esperam, contudo, uma resposta se a empresa vai continuar funcionando e se haverá normalização da situação dos empregados ou, em outra hipótese, se eles serão liberados para que possam buscar novos trabalhos. “Tem pessoas que querem arrumar outro emprego, porque não podem ficar esperando isso resolver, mas não tem como sair”, relatam.
“A nossa batalha é que, ao menos, libere a nossa carteira, libere o nosso FGTS e libere o nosso seguro desemprego para que a gente possa respirar e procurar outro emprego”, explicita uma funcionária.
Empresa arrendada
O contrato de arrendamento referente à siderúrgica Barão de Mauá – uma espécie de aluguel da estrutura – foi feito em meados de novembro. No acordo, Moisés Rivaldo passou a ter acesso e uso da empresa. No entanto, durante a primeira visita ao completo industrial, ele sentiu um mal súbito e veio a óbito. Dessa forma, segundo informações, a siderúrgica teria passado para as mãos de seus herdeiros, um deles o advogado Daniel Aroeira.
Contudo, após o ocorrido, funcionários alegam não terem tido informações sobre os rumos da empresa. Eles comentam, ainda, que durante uma reunião ocorrida na siderúrgica, foi passada a informação de que o contrato havia sido quebrado.
Em conversa com a reportagem, Daniel disse que a siderúrgica não é de sua responsabilidade. “Não sou. Até porque eu não assinei nenhum contrato”.
De acordo com Daniel, houve um compromisso acerca da possibilidade de arrendamento, mas que esse não teria sido finalizado. Dessa forma, hoje, a responsabilidade em relação à empresa seria do proprietário Bruno Violante. Já a questão da cláusula de sucessão contratual, segundo ele, é algo que “eventualmente terá de ser decidida judicialmente, se ela for levada a campo”.
Daniel alega também falta de comunicação com a outra parte envolvida. “Se você não consegue contato com a outra parte para negociar, para conversar, como é que você vai ter uma relação contratual?”, questiona.
Segundo ele, o contato tem sido realizado com os advogados de Bruno, “mas a relação negocial não é desenvolvida com os advogados. Os advogados não tomam decisões. Então é impossível viabilizar um contrato dadas as circunstâncias”, diz.
Nota da siderúrgica
Procurada, a siderúrgica Barão de Mauá emitiu nota oficial sobre o caso. Confira o texto na íntegra abaixo:
A SIDERÚRGICA BARÃO DE MAUÁ, por seu representante legal, comunica aos seus colaboradores e ao Sindicato dos Metalúrgicos de Sete Lagoas, o seguinte:
Que, na data de 14 de novembro de 2.019, o proprietário da Siderúrgica Barão de Mauá, por razões de foro íntimo, que acarretaram em sua decisão de não seguir na atividade empresarial que era empreendida na citada empresa, procedeu ao Arrendo do parque industrial, instalações, equipamentos e tudo o que se faz presente na aludida empresa, para a pessoa de Moisés Rivaldo Pereira.
Que, desde o início das tratativas do arrendo, culminando com a formalização do instrumento contratual de arrendamento, o cuidado e o objetivo primordial do proprietário da empresa foi no sentido de resguardar todas as obrigações trabalhistas da empresa junto aos seus colaboradores, motivo pelo qual, fez constar expressamente no instrumento contratual que o Arrendatário do Parque Industrial seria sucessor e solidariamente obrigado por todos os direitos trabalhistas dos colaboradores da empresa, além de o mesmo se tornar o responsável pelo adimplemento trabalhista de todos os funcionários a partir da assunção do Arrendatário no referido empreendimento, o que se deu, repita-se, em 14 de novembro de 2.019.
Que, ainda, no intuito de preservar os direitos trabalhistas dos funcionários da empresa Siderúrgica Barão de Mauá, o proprietário desta, fez constar no contrato de arrendamento firmado que o Arrendatário se obrigaria a prestar garantia real imobiliária, através de hipoteca, de imóvel de propriedade do mesmo, avaliado em aproximadamente R$ 3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais).
Que, infelizmente, poucos dias após o Arrendamento da empresa, após o Arrendatário Moisés Rivaldo Pereira sofrer um mal súbito dentro da empresa, o mesmo veio a falecer, isso em 25-11-2019, portanto, em data na qual já havia assumido a administração, gestão e a atividade empresarial a que se obrigou contratualmente. Apesar de tal infortúnio, não houve solução de continuidade no contrato de arrendamento da Siderúrgica Barão de Mauá, pois, no instrumento contratual firmado, havia a expressa determinação de os herdeiros cumprirem o contrato nos exatos termos nos quais foi firmado, o que de fato ocorreu, visto que a pessoa do Sr. Daniel Aroeira Pereira assumiu “per si” e em representação do Espólio de Moisés Rivaldo Pereira e das empresas do grupo econômico e familiar dos mesmos, todas as atividades empresariais da empresa arrendada.
Que, a partir da assunção das atividades empresariais por parte de Moisés, seus herdeiros e filho, Sr. Daniel Aroeira Pereira, os mesmos arcaram com alguns compromissos financeiros junto aos empregados aos quais se obrigaram contratualmente a observarem todos os direitos, inclusive efetuando pagamento de folha salarial e outras verbas, seja através do próprio Sr. Daniel Aroeira Pereira, seja através de empresas de grupo econômico e familiar dos mesmos, demonstrando assim, não só a continuidade e assunção de todas as atividades empresariais como o poder econômico e capacidade financeira dos mesmos.
No entanto, chegou ao conhecimento do proprietário da Barão de Mauá, notícias de que o Sr. Daniel Aroeira Pereira não mais estava dando continuidade às atividades empresariais as quais se vinculou contratualmente, inclusive se omitindo quanto à obrigação de honrar com os pagamentos trabalhistas dos funcionários, responsabilidade essa a que se obrigou contratualmente, o que gerou demasiada insegurança aos funcionários quanto a continuidade da atividade da empresa e ao próprio contrato de trabalho dos citados colaboradores.
Apesar de vários contatos com o Sr. Daniel Aroeira Pereira para que fosse esclarecida e resolvida toda a situação, bem como o mesmo honrasse com as obrigações contratuais a que está obrigado, como representante do Espólio e sócio de fato no arrendamento juntamente com as empresas de seu grupo econômico e familiar, o mesmo se mantém silente e não soluciona nem demonstra medidas efetivas a resguardarem os direitos e as obrigações trabalhistas dos colaboradores da Siderúrgica Barão de Mauá.
Dessa maneira, a fim de minimizar a situação de incerteza e indefinição quanto à continuidade dos contratos de trabalho dos funcionários da Siderúrgica Barão de Mauá, bem como os correspondentes direitos trabalhistas de seus funcionários, não resta outra alternativa à empresa em por fim a todo o vínculo trabalhista de seus empregados, a partir de 29-01-2020.
Em decorrência de todas as situações perpetradas pelo Arrendatário Espólio de Moisés Rivaldo Pereira, seus representantes e sócios integrantes do grupo econômico e familiar que assumiram a referida empresa, o proprietário não possui condições, atualmente, de honrar com o pagamento das verbas rescisórias dos funcionários da empresa Barão de Mauá cujos direitos trabalhistas foram assumidos contratualmente por sucessão e solidariedade por parte dos Arrendatários, conforme exposto alhures, no entanto, a fim de minimizar a situação financeira e pessoal dos colaboradores, o representante da Siderúrgica Barão de Mauá pretende, junto ao Sindicato dos Metalúrgicos, proceder a entrega de guias de Seguro Desemprego aos seus funcionários e o competente TRCT, no intuito de os mesmos poderem levantar o saldo fundiário existente junto à Caixa Econômica Federal.
Paralelo a isso, as tratativas quanto à eventual possibilidade de pagamento de todas as verbas trabalhistas dos colaboradores da Siderúrgica Barão de Mauá continuarão a ser conduzidas perante o Sindicato dos Metalúrgicos, no intuito de resguardar o direito de todos os funcionários.
As medidas judiciais frente aos causadores de toda essa traumática situação vivida pelos colaboradores da Siderúrgica Barão de Mauá e, também, ao seu proprietário, ou seja, o Espólio de Moisés Rivaldo Pereira, o Sr. Daniel Aroeira Pereira e as empresas integrantes do grupo econômico e familiar que assumiram a empresa e não adimpliram as obrigações a que se obrigaram contratualmente, serão objeto de ajuizamento das medidas competentes perante o Poder Judiciário, com o objetivo de todo o ressarcimento dos prejuízos a que deram causa as pessoas acima nominadas.
Vinícius Augusto