O aprendizado em sala de aula tem sido sufocado por uma onda de violência que invade as escolas de Minas. De janeiro a junho deste ano, os órgãos de segurança foram acionados 10.134 vezes para registrar crimes como furtos, ameaças e agressões em instituições de ensino do Estado, uma média de 56 casos por dia, conforme levantamento feito pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) a pedido de O TEMPO. O número é 6,3% maior do que o computado no mesmo período de 2018.
Para além do dano ao patrimônio, nos casos de invasão de criminosos nas escolas, a hostilidade e o desrespeito levam medo à comunidade escolar e desestimulam professores.
Na tentativa de frear o problema, o governo do Estado sancionou, no fim de julho, a Lei 23.366, que institui uma política estadual de promoção da paz nas escolas, com diretrizes para prevenção e enfrentamento da violência. Segundo a Sejusp, a insegurança atinge instituições públicas e privadas. Em BH, o combate aos crimes e a proteção à criança foram temas de mesa de discussão nesta terça-feira (17), em tenda no Parque Municipal, durante a Semana Municipal de Educação.
Entre educadores, é consenso que a violência se tornou algo corriqueiro nas escolas. A agressividade contamina as relações entre professor e aluno, e o aprendizado acaba abafado pelos conflitos. Depois de levar um soco no rosto, de um aluno de 11 anos em sala de aula, a professora Luiza*, 30, que dá aula em uma escola de Betim, na região metropolitana, se diz impotente e frustrada. “Você não tem o direito de exercer sua profissão e acaba sendo agredida por tentar. Eu pensei em desistir, em pedir para mudar de lotação, mas as coisas não são tão simples”, reclama.
Ela luta contra o temor de voltar a ser agredida. “O aluno não teve consequência pela atitude dele, e eu passei a ter medo de ser agredida de novo (…). Engulo meu medo e vou trabalhar porque preciso. Essa é minha vida, e eu acho que é a de milhares de professores”, desabafa.
Para Eduardo Calbucci, especialista em educação e fundador do Programa Semente, que estimula menores a lidar com as emoções de maneira adequada, a violência no ambiente escolar “gera o desinteresse do aluno pela escola e provoca um desgaste emocional do professor, o que faz com que muitos pensem em ter uma carreira diferente”.
Para ele, o governo acerta ao criar uma legislação para enfrentamento do problema, mas o primeiro desafio é preparar os gestores e os pedagogos para lidar com essa questão: “A criança também pode aprender a se comunicar de maneira não violenta”.
Questionada nesta terça-feira sobre o número das instituições de ensino que foram alvo de violência neste ano, a Sejusp informou que não tinha o dado.
Governo investe em prevenção
A Lei 23.366, que institui uma política de promoção da paz nas escolas estaduais de Minas Gerais – com diretrizes que podem ser replicadas nas unidades municipais –, prevê ação mais efetiva dos órgãos de segurança pública para o enfrentamento à violência. Pelo texto, sancionado pelo governador Romeu Zema em 25 de julho, deve ocorrer uma atuação conjunta das polícias Civil e Militar e do Poder Judiciário para garantir a segurança nas instituições de ensino.
Segundo a Secretaria de Estado de Educação (SEE), a lei corrobora “as ações já realizadas nas escolas da rede pública estadual”. Conforme o órgão, para prevenir furtos e danos ao patrimônio, a pasta em diálogo permanente com a Polícia Militar.
“Por meio da Patrulha Escolar, a Polícia Militar desempenha trabalho ostensivo de prevenção à criminalidade nas escolas do Estado”, informou a secretaria.
Projetos
A SEE destacou que já mantém os programas Convivência Democrática, Justiça Restaurativa nas Escolas e Mediação de Conflitos no Ambiente Escolar, todos de caráter preventivo e com medidas que articulam estratégias pedagógicas para melhorar a convivência entre estudantes, professores e demais membros da comunidade escolar.
Sem diálogo
Crítica
Diretor do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais, Paulo Henrique Santos Fonseca considera bem-vindas leis que previnam a violência nas escolas, mas reclama que não houve participação da comunidade escolar para a construção das normas da Lei 23.366/2019.
Geral
“Essa lei repete, de forma mais genérica, muitas medidas já deliberadas pela Lei 22.623/2017 – essa, sim, com a participação dos trabalhadores”, afirmou.
*Nome fictício
Com O Tempo