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Coronavírus: famílias vivem drama de enterrar mortos sem direito à despedida

A dor de perder uma pessoa querida soma-se, em tempos de pandemia de coronavírus, ao sofrimento e a angústia de não poder dizer adeus. Em Belo Horizonte, desde esta terça-feira (31), os quatro cemitérios municipais passaram a realizar apenas o sepultamento dos mortos, sem realização de velório, independentemente da causa da morte. A medida visa reduzir aglomerações em espaços fechados, como forma de prevenir a proliferação do vírus, e será válida enquanto durar o estado de emergência na capital.

No Cemitério do Bonfim, o mais antigo de Belo Horizonte, velórios estão suspensos. Foto: Uarlen ValérioNo Cemitério do Bonfim, o mais antigo de Belo Horizonte, velórios estão suspensos. Foto: Uarlen Valério

O aposentado Paulo Pereira, 79, não pôde se despedir como queria do irmão, Eduardo de Pereira, de 74 anos, que não morreu por coronavírus, mas partiu em meio à pandemia. Ele tinha diabetes e problemas no coração e chegou a ficar três dias internado neste mês. Recebeu alta e continuou o tratamento em casa, mas, na madrugada de ontem, não resistiu.

"Eu sou o irmão mais velho, ele furou fila. Não pudemos fazer um velório, fizemos apenas um cortejo até o sepultamento. Fiquei chateado, mas entendo, porque ainda estamos no início da curva de casos, temos que cuidar. Eu nunca imaginei na vida que íamos passar por isso", afirmou Paulo, que enterrou o irmão no cemitério da Saudade, na região Leste de Belo Horizonte. Os velórios também estão suspensos nos cemitérios da Consolação, da Paz e do Bonfim.

Em casos de suspeita de Covid-19, o Ministério da Saúde recomenda que velórios e funerais que juntem muitas pessoas em um ambiente fechado não sejam realizados em nenhuma parte do país. O caixão deve permanecer fechado para evitar qualquer contato com o corpo.

Paulo Alves, filho de João Alves Paulino, de 79 anos, que morreu com suspeita de coronavírus em Patos de Minas, na região do Alto Paranaíba, no último sábado (28), passou por esse drama. "Enterrei meu pai, sem velório, sem família e sem amigos. Eu, meu pai, um coveiro e duas pessoas da funerária. (Ele) partiu sem as últimas homenagens na terra, mas estou certo das muitas homenagens no céu", publicou Paulo nas redes sociais. "Estamos todos consternados e com um sofrimento profundo", disse.

A psicóloga e psicanalista membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise, Cristiane Barreto, diz que os rituais de despedida são essenciais e auxiliam no processo de luto.

Ela recomenda, nesse tempo em que os velórios não são permitidos, que cada um faça um ritual particular. "Acho que as pessoas têm que fazer um ritual íntimo, de onde e com quem puderem, um ritual que envolva algum objeto, um pedaço de lembrança, pode ser uma carta, algo afetivo que lembre a pessoa", afirma. Ela diz que as pessoas também podem utilizar recursos de tecnologia para estarem próximas, mesmo que de longe.

A psicanalista acredita a pandemia vai mudar a forma do mundo de ver a vida e a morte. "A gente vive acreditando que não vai morrer, em uma cultura ocidental que nega muito a morte. Não é romantizar o futuro nem banalizar o presente, mas isso vai passar e vamos ter, ao final dessa travessia, tempo e outros espaços pra estarmos juntos", afirma.

Com O Tempo



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