A Câmara de Sete Lagoas rejeitou, em sua última sessão plenária, um pedido de providências vindo do Parlamento Jovem que solicitava a ‘coibição da doutrinação nas escolas’ do município. A pauta gerou discussões entre grupos políticos antagônicos nas redes sociais e no plenário do Legislativo.
Em sua justificativa, uma vereadora do Parlamento Jovem apontava que “o combate contra a doutrinação dentro das escolas é fundamental para conscientizar a sociedade a importância da educação, [sic] a educação deve ser um espaço de formação crítica e reflexão, onde os alunos possam desenvolver suas próprias opiniões”. Nele, era solicitado a garantia da “liberdade de pensamento”. Por fim, o pedido indica que a Prefeitura Municipal tome providências acerca disso juntamente à Secretaria Municipal de Educação e gestores de colégios.
VEJA O PEDIDO DE PROVIDÊNCIA NA ÍNTEGRA
Em sua apresentação no plenário, o presidente da Câmara Caio Valace (PDT) deixou claro que, pela pauta ter vindo através do Parlamento Jovem, teria que colocar em apreciação dos edis. Ele argumentou sobre a competência da solicitação, que é de ordem federal. Caio apresentou uma decisão do Supremo Tribunal Federal pela inconstitucionalidade de uma lei de Alagoas que versava contra a “doutrinação nas escolas”.
Houve um embate entre os edis sobre o pedido de providências, principalmente entre os vereadores Ivson Gomes (PL) e Rodrigo Braga (MDB). A mesa diretora da Câmara decidiu colocar em pauta a prejudicialidade dele (isto é, se ele realmente deveria ser discutido pelo Legislativo ou endereçado para outro órgão). A maioria decidiu que este estava prejudicado, com os votos contrários de Pastor Alcides (Republicanos), Janderson Avelar (MDB), Roney do Aproximar (PP) e Ivson.
Veja a votação e discussão (a partir de 1h30min00):
Opiniões
A Associação de Mulheres na Política foi o grupo que se manifestou nas redes sociais sobre a inconstitucionalidade do pedido de providências, relatando que só a União pode legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Carolina Cabral Loiola, presidente da organização, aponta que o pedido não tem um fundamento básico para ele:
“Ficou tudo no ar e estamos atentas porque este mal precisa ser cortado pela raiz. O que é doutrinação? Que tipo de ensino é ofertado no município? É condizente com a Base Nacional Comum Curricular e os currículos de referência? Para que criar leis que os professores e professoras já sabem o que deve ou não fazer? A escola tem que ser laica e não se pode fazer proselitismo religioso. Uma outra observação, nos parece que o Parlamento Jovem e Câmara estão querendo coagir professores e não melhorias efetivas na educação! Esse pedido de providências é reacionário e não aceitaremos este absurdo, pedagogicamente e didaticamente explicamos isso aos nobres vereadores.”
Carolina acredita que a proposta apresentada no Parlamento Jovem teria uma orientação de um adulto, “retrógrado e mal informando usando esta jovem” autora do pedido de providências. “Esperamos também que esta jovem estude mais, se informe melhor e entenda que é preciso sempre abrir o diálogo quando se busca falar e propor algo que afetará a vida de profissionais, seja ele de qual área for mas especialmente da educação”, completa.
O vereador Ivson de Castro, a favor do projeto, relatou que o pedido de providências requeria da Prefeitura de Sete Lagoas ações para combate da “doutrinação esquerdista nas escolas do município”:
“Ou seja, ela [a vereadora do Parlamento Jovem] não queria legislar em nome da União, como alguns vereadores disseram, ela queria que o prefeito usasse os meios legais que cabem a ele para que o professor ensine as verdades científicas e não ideologias totalitárias. Ela queria algo que prezo muito, que é para a escola ensinar nossos filhos matérias que vão desenvolvê-los intelectualmente e não transformar nossas crianças e jovens em militantes de uma ideologia que cada dia mais destrói famílias.
Ela não queria intervir no planejamento educacional, ela não queria tirar e nem colocar nada, ela queria que os professores cumpram a ética educacional para serem professores de verdade ensinando não apenas um lado da história, mas ambos, para aí sim os alunos criassem senso crítico, raciocínio perante a realidade e enfim sejam cada dia mais libertos da ignorância”.
O edil ainda aponta que não se pode negar “que haja esse tipo de doutrinação esquerdista para o mal em nossas escolas”, como pesquisas sobre identidade de gênero e palestras sobre aborto. “O cidadão de Sete Lagoas pode contar comigo na luta contra essas ideologias que considero prejudiciais ao desenvolvimento educacional e social das nossas crianças e jovens”, finalizou.
O que a legislação diz
É de competência da União a elaboração do Plano Nacional de Educação e de realizar diretrizes para o ensino no geral, regido pela lei federal 9.394/96. Normativas municipais e estaduais que versavam contra “doutrinação” e discussões sobre “identidade de gênero” foram derrubadas no Supremo Tribunal Federal pelas suas inconstitucionalidades