No âmbito do Senado, encontra-se em tramitação um projeto de lei cujo objetivo é assegurar o registro de dupla maternidade, dupla paternidade e monoparentalidade nas certidões e registros dos cidadãos. Isso implicaria na possibilidade de incluir os nomes de duas mães, dois pais ou de apenas um dos genitores responsáveis pela criança em documentos oficiais, como certidões de nascimento, carteiras de identidade e números de CPF.
A proposta, apresentada em agosto de 2022 pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), que possui dois filhos em um casamento homoafetivo, estava na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na última quarta-feira (18), mas teve sua votação adiada, sem uma data prevista para análise. O projeto contradiz a tendência de avanço da proibição do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, que está em discussão na Câmara dos Deputados devido à mobilização da ala conservadora.
O texto proposto visa ao reconhecimento dos núcleos familiares homoafetivos e monoparentais perante a Receita Federal no Cadastro de Pessoa Física (CPF), que agora é utilizado como um número único de identificação nacional. Para isso, pretende eliminar o termo “ainda que ilegítimos” da legislação, presente na Lei de Registros Públicos, considerado discriminatório pelo autor do projeto.
O senador Contarato ressalta que o conceito de família não deve ser rigidamente definido pela Constituição de 1988, que atualmente considera entidade familiar a união entre homem e mulher. Ele enfatiza que uma entidade familiar pode, legítima e igualmente, ser formada por uma união homoafetiva, baseada no afeto entre indivíduos do mesmo sexo, e, portanto, não deve ser sujeita a qualquer forma de discriminação.
Contarato destaca ainda que vários sistemas e bancos de dados públicos, como o CPF da Receita Federal e a base de dados da Justiça Eleitoral, ignoram famílias com dupla maternidade ou paternidade, ao vincularem o cadastro ou o acesso a direitos e benefícios sociais apenas ao nome de uma mãe. Ele enfatiza que essa situação força essas famílias a recorrerem ao Poder Judiciário para exercer plenamente seus direitos, gerando inconsistências nos dados e, potencialmente, a negação de direitos importantes, como a retirada de passaportes e a participação em programas governamentais de assistência, como o Bolsa Família e o auxílio emergencial.
O projeto de Contarato já foi aprovado na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado e segue em processo de decisão terminativa. Isso significa que, caso também obtenha aprovação na CCJ, seguirá para debate na Câmara dos Deputados sem passar pelo plenário do Senado, a menos que haja recurso contra essa decisão.
Nos dois colegiados, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) emitiu parecer favorável ao projeto, com sugestões de alterações, uma delas sendo a inclusão do campo “intersexo” como informação na Certidão de Nascido Vivo, independentemente da decisão de preenchimento do campo “sexo” como ignorado. A intenção disso é coletar dados sobre crianças que nascem com características de intersexualidade, que atualmente não são registradas. Essa definição seria de caráter biológico, como em casos de hermafroditismo, e não uma escolha dos pais com base em suas crenças pessoais.
Alessandro Vieira lembra que o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu a discriminação com base no sexo, gênero e orientação sexual, equiparando relações homoafetivas a uniões estáveis entre homens e mulheres em 2011. De acordo com ele, a Constituição Federal não restringe o conceito de família a casais heteroafetivos, deixando claro que a expressão “família” abrange uma variedade de formações familiares, independente de formalidades cartoriais, celebrações civis ou liturgias religiosas.
Da redação
Fonte: O Tempo