Março é um mês dedicado à conscientização sobre a endometriose no Brasil, através da campanha Março Amarelo. A doença, que afeta uma a cada 10 mulheres no país, é uma condição ginecológica silenciosa e complexa que pode causar dores crônicas, cólicas menstruais intensas, infertilidade e até dificuldades nas relações sexuais. Comemorada desde 2013, a campanha visa alertar sobre a importância do diagnóstico precoce e do tratamento adequado.

Em entrevista à nossa reportagem, a Dra. Priscilla Rossi Baleeiro Marcos, ginecologista especializada em oncologia e videolaparoscopia, mestre em Ciências da Saúde, compartilhou detalhes sobre a endometriose e a relevância de um diagnóstico rápido. A jornalista, que também foi diagnosticada com a doença, relata sua própria experiência, enfrentando desafios no tratamento e na adaptação ao novo estilo de vida.
A endometriose e seus sintomas
A endometriose ocorre quando o tecido que normalmente reveste o útero cresce fora dele, podendo atingir os ovários, intestinos e outras partes do corpo. Os sintomas variam de mulher para mulher, mas as dores intensas, cólicas crônicas e dificuldades para engravidar são comuns. “Essa doença muitas vezes é silenciosa e os sintomas podem ser facilmente confundidos com outras condições, como cólicas menstruais intensas, inchaço, fadiga e dor nas relações sexuais”, afirma a Dra. Priscilla.
Dificuldade no diagnóstico
O diagnóstico da doença costuma ser tardio, o que é um grande desafio para muitas mulheres. “Infelizmente, o diagnóstico da endometriose muitas vezes é tardio”, explica a médica. “A paciente demora a procurar ajuda devido à normalização de sintomas como cólicas ou dores durante as relações sexuais, ou por não saber que esses sinais são indicadores da doença.” A endometriose, em muitos casos, é diagnosticada apenas quando a mulher enfrenta dificuldades para engravidar, condição que atinge cerca de 8 milhões de mulheres no Brasil. “Estima-se que entre 30% e 50% dos casos de infertilidade feminina sejam causados pela endometriose”, completa Dra. Priscilla.
A jornalista que vos escreve também enfrentou esse desafio. “Após trocar várias vezes de médico, consegui o diagnóstico. Isso me fez mudar drasticamente a forma como me alimentava, me exercitava e cuidava da minha saúde mental”, relata. “Confesso que não está sendo fácil, mas desde que comecei o tratamento, me sinto mais disposta e com menos dores.”
Exames e diagnóstico da Endometriose
A Dra. Priscilla explica que o diagnóstico começa com uma história clínica detalhada e exame físico, onde é possível identificar nodulações e pontos dolorosos. “No entanto, para confirmar o diagnóstico e mapear a extensão da doença, são necessários exames de imagem como ultrassonografia endovaginal e ressonância magnética, realizados por profissionais capacitados“, orienta.
Estágios da Endometriose
A endometriose é classificada em três estágios: superficial, ovariana e profunda. “A gravidade da doença é determinada pela extensão e profundidade das lesões e pelos órgãos afetados”, explica a Dra. Priscilla.
“Curiosamente, a intensidade dos sintomas nem sempre se correlaciona com o estágio da doença. Uma paciente com lesões superficiais pode sofrer de dor intensa e infertilidade, enquanto outra com lesões profundas pode não apresentar sintomas significativos.”
A médica também destaca que a doença pode ser assintomática ou ter sintomas leves, o que dificulta seu diagnóstico precoce. “Muitas vezes, sintomas como dor pélvica ou menstruação dolorosa são ignorados.”
Dra. Priscilla destaca os seis principais sintomas da endometriose, conhecidos como os “6 Ds”:
- Dismenorréia: dor intensa durante a menstruação
- Dispareunia: dor durante as relações sexuais
- Dor pélvica: dor contínua ou intermitente na região pélvica
- Disúria: dor ao urinar
- Dor ou sangramento intestinal
- Dificuldade para engravidar
Ela ainda ressalta que, embora os órgãos mais comuns afetados pela endometriose sejam os pélvicos, como útero, ovários, intestinos e bexiga, a doença pode se espalhar para outras regiões do corpo, como o abdômen, pulmões e, em casos raros, o cérebro.
Tratamento
O tratamento da endometriose envolve tanto abordagens clínicas quanto cirúrgicas. “O tratamento clínico é fundamental e pode controlar bem os sintomas na maioria das mulheres”, explica Dra. Priscilla. “Mudanças nos hábitos de vida, como a prática regular de atividades físicas, alimentação balanceada e controle do estresse, são essenciais para melhorar a qualidade de vida.”
“Associado às mudanças do estilo de vida, muitas vezes é necessário o uso de tratamentos hormonais, medicamentos específicos para o controle da dor, como analgésicos, anti-inflamatórios e até mesmo antidepressivos que atuam modulando a dor.” completa.
Quando o tratamento clínico não é suficiente, a cirurgia é indicada. “A cirurgia não envolve necessariamente a remoção do útero”, esclarece a médica. “É indicada quando há falha no tratamento clínico, dor persistente ou comprometimento de órgãos, como obstruções intestinais ou das vias urinárias.”
A endometriose também é uma das principais causas de infertilidade feminina. Ela pode afetar a função reprodutiva dos ovários, causar aderências e obstruções nas trompas e até interromper a gestação. “A cirurgia pode ajudar a reverter a infertilidade em alguns casos, mas em situações mais graves, quando há lesões extensas ou a necessidade de remoção das trompas, a fertilização in vitro pode ser uma opção”, destaca a Dra. Priscilla.
A endometriose não tem cura, mas é possível viver bem

Embora a endometriose não tenha cura, a Dra. Priscilla explica que com o tratamento contínuo e o acompanhamento regular, é possível viver bem e minimizar os sintomas. “É importante que a paciente faça um acompanhamento de longo prazo, mesmo após a menopausa, pois a doença tem predisposição genética”, alerta a médica. “O manejo da endometriose envolve uma equipe multidisciplinar, incluindo ginecologistas, fisioterapeutas, nutricionistas, sexólogos e outros profissionais especializados.”