O ano de 2025 começou com grandes expectativas para as empresas que operam no comércio exterior, principalmente no que diz respeito a conclusão das negociações do acordo entre o Mercosul e a União Europeia. O que cria não só uma possibilidade real de o Brasil aumentar o fluxo comercial com o velho continente, mas também permite uma maior visibilidade dos produtos fabricados no Brasil para o resto do mundo à medida que a própria Europa se torna uma vitrine dos produtos brasileiros.
Embora existam outras etapas até a efetiva internalização dos termos do acordo, o questionamento que se segue é saber quais os principais ganhos serão perceptíveis às empresas brasileiras, da mesma forma entender quais segmentos da economia serão os mais impactados.
Esses questionamentos vão de encontro com o pensamento do filósofo francês Voltaire que, em meados do século XVIII, mesmo vivendo em uma monarquia absolutista, ao defender que “o país onde o comércio é mais livre será sempre o mais rico e próspero, guardada as proporções”, trouxe à luz a ideia que, ao criar um fluxo comercial com menos restrições entre dois blocos, os países envolvidos tendem a prosperar mais, guardadas as proporções comerciais de cada um.
É importante deixar claro que o acordo ainda não foi assinado. Somente a negociação foi concluída. Logo, os textos negociados precisam passar por uma revisão jurídica e, posteriormente, traduzidos para os idiomas oficiais de cada país membro. Concluídas essas etapas, o acordo será assinado e internalizado pelos países. Uma vez assinado, o acordo torna obrigatório para o país que o ratifica, restando apenas a definição da entrada em vigor que, no caso do Brasil, será mediante assinatura de um decreto pelo presidente da República determinando o cumprimento do acordo.
Dados do governo brasileiro revelam que a Europa é o segundo maior parceiro comercial do Brasil. Nas exportações, o velho continente representa 17.8% (14.3% União Europeia) de participação, ficando atrás apenas da Ásia, com 42.8%. Já nas importações, também aparece em segundo lugar, com participação de 25.4% (18% União Europeia), ficando atrás novamente da Ásia, com 36.8%.
O acordo foi pensado no compromisso de desgravação tarifária para o setor agrícola e industrial. Passando pelas boas práticas regulatórias, pela redução das barreiras técnicas ao comércio e simplificação das medidas sanitárias e fitossanitárias, como também àquelas de harmonização de procedimentos aduaneiros até o desenvolvimento sustentável de cada país membro, entre outros.
No setor agrícola, a ideia inicial é liberar 77% das linhas tarifárias, ou seja, negociar o imposto de importação para 77% dos produtos agrícolas comercializados entre os países dos dois blocos, dando acesso preferencial para uma série de produtos de interesse mútuo.
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Para o setor industrial, ficou acordado que a União Europeia liberaria 80% das linhas tarifárias já na entrada em vigor do acordo, bem como se comprometeria em eliminar 100% das tarifas de importação em até 10 anos.
Dado que o acesso preferencial, entre outros, se dá por meio do estabelecimento de cotas. Nesse sentido, os produtos brasileiros terão cotas especificas, de modo que uma quantidade negociada para determinados produtos acesse os países do bloco europeu com uma tarifa preferencial. Ainda assim, quando comparadas as exportações brasileiras com as cotas negociadas no acordo, percebe-se uma cota acima da quantidade exportada pelo Brasil para a Europa durante o ano de 2024.
Destacam-se como produtos agrícolas de interesse do bloco europeu: carnes, frutas, açúcar, café, milho e sorgo, mel, etanol, arroz, suco de laranja, cachaça, queijos, iogurte, entre diversos outros itens.
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Para que se tenha uma ideia, a exportação brasileira de carne bovina ultrapassou os 2,8 milhões de toneladas em 2024, dos quais 82.3 mil tiveram a União Europeia como destino. No acordo, o bloco ofereceu 99 mil toneladas de peso carcaça, tendo uma tarifa reduzida a zero na entrada em vigor. Enquanto para a carne de aves foi de 180 mil toneladas peso carcaça e para carne suína apenas 25 mil toneladas. Foi ofertada cota de 180 mil toneladas para o açúcar e 450 mil toneladas de etanol industrial.
Os produtos dos quais o Brasil tem certa expressão no cenário mundial como o queijo, foi oferecido 30 mil toneladas. Já a cachaça a granel com cota de 2400 toneladas e quando engarrafados em garrafas inferiores a 2 litros, o comércio será liberado em 4 anos. As frutas, em sua maioria, tendo o Brasil como grande celeiro do mundo, não são objeto de cotas; logo, suas tarifas serão eliminadas.
No setor industrial, existe o compromisso de a União Europeia eliminar 100% das tarifas de importação em até 10 anos após ratificado o acordo, com 80% das linhas tarifárias já sendo aplicadas de imediato.
Embora se perceba uma baixa competitividade dos produtos brasileiros de alta complexidade como máquinas, equipamentos médicos, autopeças, entre outros. O acordo, por outro lado, tende a estimular os investimentos nesses setores, dando uma nova perspectiva a longo prazo. Enquanto isso, nas áreas têxteis e de calçados, haverá um compromisso mútuo na proteção à indústria local.
Tomadas as devidas proporções, o Mercosul ainda encontra no setor agrícola a principal vantagem competitiva, enquanto a União Europeia tem em seu parque Industrial um forte aliado para aumentar a presença nos países membros do Mercosul, aumentando o desafio para a indústria local.
O acordo afetará todos os países em diferentes áreas, ao mesmo tempo que criará oportunidades de construir um comércio mais forte. No caso Brasil, o agronegócio tende a ser o setor da economia mais impactado dado à necessidade maior do bloco europeu por produtos desse segmento. Ainda assim, a indústria brasileira enfrentará um aumento significativo dos produtos europeus de maior valor agregado. Espera-se que a indústria brasileira se fortaleça com as oportunidades que serão criadas e aprenda com os desafios que estão por vir a se reinventarem em um mercado cada vez mais global.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
SISCOMEX. Mercosul e União Europeia. Disponível em: https://www.gov.br/siscomex/pt-br/acordos-comerciais/acordos-comerciais/mercosul-uniao-europeia. Acesso em 15 Fev. 2025.
SECOM. Balança Comerci. Disponível em: https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2025/janeiro/balanca-comercial-tem-superavit-de-us-74-5-bilhoes-em-2024-segundo-melhor-resultado-da-serie historica#:~:text=A%20Secretaria%20de%20Com%C3%A9rcio%20Exterior,US%24%20262%2C5%20bilh%C3%B5es. Acesso em 15 Fev. 2025.