Quando se fala em parceria público-privada muito se especula a respeito da sua real eficiência na gestão dos gastos públicos e na melhoria dos serviços oferecidos à população.
No mundo dos negócios, parcerias são estrategicamente construídas a fim de que uma ou mais empresas possam se fortalecer no segmento em que atuam. Esse tipo de estratégia vem sendo adotada também pelo poder público, por meio da parceria público-privada, como forma de melhorar a eficiência da gestão pública e/ou oferecer uma infraestrutura de mais qualidade aos usuários.
O que se percebe no Brasil hoje em relação à parceria público-privada é um modelo cuja iniciativa privada administrando ou explorando, durante um período, um ativo ou um serviço público, como uma estrada, um hospital, um presídio, o serviço de coleta de lixo, a linha de ônibus/metrô, etc.
Nesse tipo de modelo, existe uma contrapartida financeira, ou seja, a iniciativa privada receberá do poder público, de alguma forma, por todo o investimento feito, seja por meio da cobrança de pedágio de uma estrada concedida, seja por meio da tarifa cobrada aos usuários de ônibus/metrô – ainda que uma parte seja financiada pela parte pública –, ou por meio da remuneração paga pela administração de um hospital, ou pela coleta de lixo, etc.
Imagine agora uma parceria público-privada constituída apenas na confiabilidade, sem nenhuma contrapartida financeira, nenhum tipo de favorecimento político ou controvérsias de qualquer natureza. Com essa proposta, a Receita Federal vem apresentando à iniciativa privada uma parceria fundamentada em ganhos mútuos e alicerçada na aprendizagem constante pelas trocas de conhecimento e informação. Ela pode ser traduzida como Programa de Operador Econômico Autorizado, ou simplesmente, Programa OEA.
Antes de entender como funciona o modelo de parceria proposto pela Receita Federal, vale lembrar que no comércio exterior, temos, dentre outros órgãos, a Receita Federal, responsável pela fiscalização e controle do fluxo de mercadorias e de dinheiro que entram e saem do país, além da administração dos tributos federais e do combate à evasão fiscal, contrabando, tráfico de drogas, armas e animais. Além dos órgãos anuentes, responsáveis pela análise técnica de determinadas mercadorias e/ou tipo de operação, como a ANVISA, Exército, MAPA, SECEX, etc. com vistas à obtenção de autorização complementar à entrada ou saída do país.
Do outro lado, temos os operadores no comércio exterior, que são todos aqueles intervenientes envolvidos na movimentação internacional de mercadoria, como importadores, exportadores, transportadores, agentes de cargas, depositários de mercadoria em recinto alfandegado e operadores portuários e aeroportuários.
O Programa OEA nasceu pela busca em oferecer mais segurança à cadeia logística internacional, visto que em cada etapa e com cada operador envolvido há um risco inerente à operação mas, sobretudo, quando determinadas ações criam situações de atos ilícitos, permitindo que rupturas sejam criadas em toda a cadeia logística.
Nesse sentido, uma das premissas do programa é a gestão de riscos e como a sua execução poderá trazer mais segurança à cadeia logística, além de permitir que as empresas estejam em conformidade com o cumprimento das obrigações tributárias e aduaneiras. À medida que as empresas estejam alinhadas com esses princípios, a Receita Federal as enxergará como operadores de baixo risco e, consequentemente, as oferecerá certos benefícios como forma de otimizar o fluxo da operação, seja na importação ou na exportação.
Isso quer dizer que “(…) O Operador Econômico Autorizado (OEA) é um parceiro estratégico da Receita Federal que, após ter comprovado o cumprimento dos requisitos e critérios do Programa OEA, será certificado como um operador de baixo risco, confiável e, por conseguinte, gozará dos benefícios oferecidos pela Aduana Brasileira, relacionados à maior agilidade e previsibilidade de suas cargas nos fluxos do comércio internacional”.
Em termos práticos, pode-se dizer que o Programa reconhece o risco como sendo parte de qualquer atividade logística. Por exemplo, o risco de roubo de uma carga é inerente às atividades de transporte, mas se existe uma gestão de frota, programas e ferramentas capazes de rastrear o veículo, há um treinamento dos motoristas diante a tais situações, etc. O risco não deixa de existir, mas o tempo de resposta diante a um evento dessa natureza trará mais confiabilidade e segurança à atividade. E, embora roubo de carga não seja uma preocupação da Receita, ela precisa enxergar como a empresa, em suas operações de comércio exterior, mapeou essa ameaça na gestão de riscos e as ações apresentadas para reduzir a ocorrência dela.
Uma vez certificada, a empresa poderá usufruir dos benefícios do Programa, dependendo da modalidade da certificação. A modalidade pode ser o OEA-Segurança (OEA-S), ligada aos critérios de segurança aplicados à cadeia logística no fluxo das operações de comércio exterior e o OEA-Conformidade (OEA-C), subdividindo-se em OEA-C Nível 1 e OEA-C Nível 2, ligada aos critérios de cumprimento das obrigações tributárias e aduaneiras.
Logo, para as empresas certificadas no OEA-S, dentre os benefícios, destacam-se (1) redução do percentual de seleção de declarações de exportação do OEA para os canais de conferência aduaneira, em relação aos demais declarantes; (2) processamento de forma prioritária, pelas unidades da RFB, das declarações de exportação do OEA selecionadas para conferência aduaneira; e (3) acesso prioritário para o transportador OEA a recintos alfandegados.
No que tange aos benefícios do OEA-S, percebe-se um ganho de tempo nas liberações e na conferência aduaneira, refletindo na redução dos custos de armazenagem, no atendimento aos prazos de contrato e, especialmente, na segurança que o comprador estrangeiro terá ao adquirir um produto de empresa brasileira certificada como OEA.
Para as empresas certificadas no OEA-C, dentre os benefícios, destaca-se para o OEA-C Nível 1 e 2, conjuntamente, (1) tratamento de armazenamento prioritário e permanecia sob custódia do depositário para mercadoria importada por OEA e que proceda diretamente do exterior, até apresentação da declaração aduaneira, sendo permitido o tratamento de “carga não destinada a armazenamento”.
Já para o OEA-C Nível 2 destacam-se (1) execução imediata da seleção para os canais de conferência aduaneira após o registro das declarações aduaneiras e (2) permissão ao importador certificada como OEA, no caso de importação por meio aquaviário, para registrar a declaração de importação antes da chegada da carga ao território aduaneiro, sem prejuízos à seleção para os canais de conferência aduaneira.
Em relação aos benefícios do OEA-C, percebe-se um ganho de tempo na liberação da carga importada quando da possibilidade de aplicar tratamento de armazenamento prioritário. No modal aéreo, a possibilidade de aplicar TC-1 (Carga Pátio – não destinada a armazenamento), permite a liberação quase que imediata da carga, após encerramento do termo de entrada e conferência do MAPA, quando há presença de madeira. Já no modal aquaviário, a possibilidade de aplicar o “Despacho sobre Água”, permite à empresa OEA-C Nível 2 fazer o registro da declaração de importação antes da chegada da carga e seu descarregamento no porto de destino final, agilizando a entrega ao importador.
Estrategicamente pensado pela Receita Federal, o Programa ainda não é extensivo a todos os operadores do comércio exterior, mas espera-se com o OEA 2.0 a adesão de mais empresas ao Programa.
Percebe-se, portanto, que uma empresa OEA, além dos benefícios com a Receita Federal e com os órgãos anuentes, à medida que esses órgãos vão aderindo ao Programa, como é o caso do Ministério da Agricultura, por meio do OEA-Agro, passa a ter um maior controle do fluxo de trabalho com todos os envolvidos na cadeia logística e como todos ajudam a construir um comércio mais confiável e seguro a todos que nele operam.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
RECEITA FEDERAL. Importação e Exportação OEA. Disponível em <https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/aduana-e-comercio-exterior/importacao-e-exportacao/oea>. Acesso em 18 Nov 2020.
NA PRATICA. O que são parcerias público-privadas. Disponível em: <https://www.napratica.org.br/o-que-sao-parcerias-publico-privadas/>. Acesso em 18 Nov 2020.
Franciney Carvalho é graduado em Administração com ênfase em Comércio Exterior pelas Faculdades Promove e pós-graduado em Logística pela UNA. Professor de Comércio Exterior nos cursos de Administração, Logística e Contabilidade no Centro de Formação e Aperfeiçoamento Profissional – CEFAP.