Desde o início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil muitas questões vêm sendo levantadas a respeito do momento em que as empresas estarão autorizadas a importar e comercializar as vacinas já registradas ou autorizadas para uso emergencial pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Vale lembrar que a importação de produtos ligados à saúde humana é permitida à iniciativa privada e pública, bem como às pessoas físicas sempre que, para esse terceiro grupo, ficar caracterizada a destinação para uso humano, próprio ou individual, respeitando os limites estabelecidos pela Receita Federal e ao cumprimento dos requisitos estabelecidos pela Anvisa.
A importação de produtos ligados à saúde humana, por pessoa física, seja para o próprio uso ou de um terceiro, poderá ocorrer sempre que não houver similar nacional, não caracterizar destinação comercial seja pela quantidade ou pela frequência, estar acobertada por uma receita médica ou equivalente para fins comprobatórios de uso para apresentação à autoridade sanitária no local de entrada.
Nesse sentido, um viajante pode trazer de outro país produtos sujeitos a algum tipo de controle sanitário pela autoridade sanitária no Brasil ou, em alguns casos, dispensados quando se tratar, dentre outros, de produtos de higiene pessoal, cosméticos, perfumes e medicamentos trazidos na própria bagagem ou na bagagem desacompanhada; e para os casos de importação de pessoa física cujo envio seja feito via remessa expressa ou remessa postal, seguirá os mesmos requisitos exigidos nas outras modalidades.
Dado isso, ainda que uma pessoa, ao voltar de uma viagem ao exterior, traga na bagagem qualquer tipo de vacina, inclusive as autorizadas para uso contra a Covid-19 pela Anvisa, independente se devidamente justificada ou não na Declaração de Bens de Viajante (e-DBV), a entrada da vacina não será permitida em virtude da Resolução da Diretoria Colegiada – RDC Nº 479, de 12/03/21 que ” (…) estabelece proibições para as importações de produtos sujeitos à vigilância sanitária, realizadas por pessoa física para uso próprio, por meio de quaisquer modalidades de importação durante a pandemia do novo coronavírus”, quando se tratar de “(…) I- soros hiperimunes e vacinas na forma de matéria-prima, produto semielaborado, produto a granel ou produto acabado.”
Enquanto perdurar essa proibição às pessoas físicas no Brasil, nada impede, por exemplo, de os brasileiros buscarem a vacinação em outros países, observando sempre as restrições estabelecidos por aquele país, além dos cuidados inerentes às viagens internacionais, principalmente, nesse momento cujo foco está no que se pode dizer “turismo de vacinas”.
Observada essa restrição imposta à pessoa física pela Anvisa, a importação de produtos sujeitos ao controle sanitário continua sendo permitida às empresas, desde que habilitadas a operarem no comércio exterior, estejam também autorizadas a exercerem as atividades na importação desses produtos.
Ao iniciar as atividades na importação de produtos sujeitos ou não a algum tipo de controle sanitário, a empresa precisa verificar se é necessário obter uma Autorização de Funcionamento (AFE) ou Autorização Especial (AE), concedida pela Anvisa, de acordo com a classe do produto (cosméticos, perfumes, produtos de higiene, saneantes e produtos para saúde) relacionada à atividade exercida (fabricação, importação, exportação, distribuição, embalar, reembalar e transporte).
Isso quer dizer que, ao fazer a importação de vacinas, cuja finalidade seja apenas importar, para que outra empresa faça a distribuição e comercialização, a empresa importadora deve peticionar uma AFE para a atividade principal de “importar”, a fim de que as vacinas (também denominadas como medicamentos imunobiológicos) tenham a entrada autorizada no Brasil. Tendo a AFE de Importadora, a empresa poderá apenas armazenar e expedir, como atividades inerentes à principal.
No entanto, se essa mesma empresa importa as vacinas para fins exclusivos de comercialização e distribuição, no estado que elas foram importadas, deve obrigatoriamente manter a AFE para a atividade de “importar”, mas ampliando a atividade principal dela para a de “distribuir”, obtendo, portanto, uma AFE de importadora e uma AFE de distribuidora.
Vale ressaltar que a empresa pode ser detentora do registro da vacina mesmo não sendo a fabricante. Caso a empresa importadora não tenha a atividade de fabricar, ela não pode fazer a ampliação da atividade principal para embalar, reembalar e fracionar, ficando limitada em apenas “(…) colocar dizeres em língua portuguesa para comercialização no mercado nacional, sem alterar o modelo da embalagem original”. Assim, a empresa que tem uma AFE para importar poderá ampliar as atividades apenas para a de fabricar, exportar, distribuir, embalar, reembalar e transportar.
Nesse sentido, mesmo uma empresa que deseja importar diretamente ou por conta e ordem as vacinas para enfrentamento da Covid-19 queira se basear no argumento do qual o governo emitirá “(…) autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa considerados essenciais para auxiliar no combate à pandemia do coronavírus, registrados por uma autoridade sanitária estrangeira”, conforme Art 3º, VIII, a, da Lei nº 13.979, de 06/02/20. Ainda assim, essa prerrogativa não é suficiente para garantir à empresa com AFE importação e AFE distribuição a possibilidade de comercializar diretamente essas vacinas.
Além disso, essa autorização não está direcionada à distribuição comercial pelas empresas, conforme apresentado no Art 13, § 3º, da Lei 14124, de 10/03/21 quando diz que “os Estados, os Municípios e o Distrito Federal ficam autorizados a adquirir, a distribuir e a aplicar as vacinas contra a covid-19 registradas, autorizadas para uso emergencial ou autorizadas excepcionalmente para importação, nos termos do art. 16 desta Lei, caso a União não realize as aquisições e a distribuição tempestiva de doses suficientes para a vacinação dos grupos previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19.”
O próprio governo criou uma alternativa para as empresas importarem as vacinas, mas estabelecendo restrições e finalidades bem específicas, como se pode observar no Art. 2º, § 1º, da Lei 14125, de 10/03/21, quando diz que “as Pessoas jurídicas de direito privado poderão adquirir diretamente vacinas contra a Covid-19 que tenham autorização temporária para uso emergencial, autorização excepcional e temporária para importação e distribuição ou registro sanitário concedidos pela Anvisa, desde que sejam integralmente doadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), a fim de serem utilizadas no âmbito do Programa Nacional de Imunizações (PNI).”
O governo ampliou também as restrições ao dizer que “após o término da imunização dos grupos prioritários previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, as pessoas jurídicas de direito privado poderão, atendidos os requisitos legais e sanitários, adquirir, distribuir e administrar vacinas, desde que pelo menos 50% (cinquenta por cento) das doses sejam, obrigatoriamente, doadas ao SUS e as demais sejam utilizadas de forma gratuita”, segundo Art 2º, § 1º, da Lei 14125, de 10/03/21.
Observa-se, portanto, que seria paradoxal afirmar que as empresas já podem importar para fins comerciais, dadas as restrições e exigências impostas pelo governo. No que tange à importação por pessoa física, entende-se que a proibição se justifica durante o período da pandemia. Ainda não se sabe quando as empresas, de fato, conseguirão importar para fins comerciais, embora alguns projetos já foram apresentados à Câmara dos Deputados, assim como algumas solicitações foram feitas por entidades de classe. Resta-nos aguardar que o setor privado e o público cheguem a um denominador comum logo para o bem-estar e à saúde da população.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LEGISWEB. Legislação. Disponível em <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=410752>. Acesso em 03 de Jul 2021.
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AMAZONAS. Wilson Lima recebe a segunda maior remessa de vacias contra a covid-19 já enviada. Disponível em www.amazonas.am.gov.br/2021/03/wilson-lima-recebe-a-segunda-maior-remessa-de-vacinas-contra-a-covid-19-ja-enviada-ao-amazonas-com-2218-mil-doses/ >. Acesso em 04 de Jul 2021.
Franciney Carvalho é graduado em Administração com ênfase em Comércio Exterior pelas Faculdades Promove e pós-graduado em Logística pela UNA. Professor de Comércio Exterior nos cursos de Administração, Logística e Contabilidade no Centro de Formação e Aperfeiçoamento Profissional – CEFAP.