A angústia de palavras imensuráveis, de sentimentos indescritíveis, de um passado que ele nem sequer se lembrava de viver. Era o que o fazia continuar a caminhar pelos destroços do que um dia chamara de lar.
Não havia ser vivo consciente, nem mesmo ele, que se considerava um revolucionário distópico cujo propósito era dar fim ao tormento de se estar sozinho em meio aos fantasmas, presos à rotina de ir e vir, ele próprio um fantasma refletido na água negra embriagante servida numa taça de cristal, tão frágil quanto sua pele azulada marcada por hematomas que jamais sairiam de seu coração que lutava contra o gelo instituído pela falta de perspectiva.
Ele estava preso a um pesadelo sem fim, a um sonho lúcido que não podia controlar, pois já era ninguém. Talvez sempre o tenha sido. Mas ele estava cansado de lutar contra um inimigo desconhecido, até inexistente. A vida, o tempo, o nada. Ele não sabia o que era, ele não sabia quem era. Podia estar morto, não saberia a diferença. A angústia o fazia sentir dor, a querer chorar lágrimas que nunca foram derramadas, a desejar se rasgar até se encontrar em um mundo colorido.
Ele desejava ser mais do que a tinta em uma folha, mas o livre arbítrio que parecia ter não era nada além de palavras escritas pela mente que o inventara. Até mesmo sua tormenta se findaria no final desta frase, bem como sua existência, ou inexistência – cabe a quem ler decidir. E assim o foi.
Paula Kilesse cursa Sistemas de Informação e escreve contos e poesias. A coluna Distopia tem como objetivo expandir seu universo, levar suas histórias para a população da cidade e indicar trabalhos similares ao seu; que destoam do usual.