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Advogado de Sete Lagoas alega ter sido vítima de prisão ilegal por parte da Polícia Civil; instituição nega

“Estou com as costas doendo, com a mobilidade do pescoço reduzida, quase desmaiei. Me deram uma chave [de braço] lá. Me algemaram com tanta força, que as minhas mãos ficaram dormentes. Estou com a marca das algemas ainda”. É dessa forma que o advogado sete-lagoano Gabriel Tolentino descreve parte dos momentos que precederam a sua prisão, ocorrida no final da tarde dessa quarta-feira (07), por volta das 16h50, no Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG), em Sete Lagoas.

Incidente ocorreu na noite dessa quarta-feira (7)./ Foto: Divulgação/ReproduçãoIncidente ocorreu na noite dessa quarta-feira (7)./ Foto: Divulgação/Reprodução

Tolentino alega que a prisão foi ilegal, já que foi detido sem que um membro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) estivesse presente no local. Segundo o artigo 7° do parágrafo 3° do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (no texto da Lei Federal n° 8.906/94), o profissional do Direito “somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável”, tal como racismo, por exemplo.

No entanto, o advogado conta que não cometeu nenhum crime no local onde toda a confusão aconteceu. Já a Polícia Civil diz que o homem teria ficado agressivo na ocasião, danificando bens públicos, informação que é negada pelo advogado.

Versão do advogado

Segundo Gabriel Tolentino, o motivo de sua ida até o Detran foi trabalho. No local, ele pretendia retirar impedimentos que constavam em relação a veículos de dois de seus clientes.

Dos ritos necessários para o serviço, a fase de contato com o Judiciário já havia sido feita, de acordo com o advogado. Faltava, então, a retirada dos impedimentos que seria realizada por uma autoridade competente da Polícia Civil.

Ele alega que tentou conversar “com ela [a Delegada], mostrando para ela que eu já tentei tudo no Judiciário, falando para ela que agora era parte do Detran de fazer aquele papel de tirar aqueles impedimentos. Ficamos naquele debate... Ela disse que nada poderia fazer”, conta. Após a negativa, ele teria continuado a parlamentação com a autoridade, na intenção de obter uma posição sobre a situação.

Durante toda a conversa com a autoridade, o advogado afirma ter agido com respeito e sem ter utilizado palavras de baixo calão. Ele alega ter solicitado uma certidão na qual deveria constar a informação de que ela não poderia resolver o caso dos impedimentos. Ela teria negado e pedido que Tolentino se retirasse da sala.

Contudo, após insistir em obter uma posição sobre as solicitações feitas por ele e também em relação ao tempo que levaria para a análise das mesmas, a autoridade teria pedido que o advogado esperasse sentado do lado de fora do cômodo. “Eu sentei e ela me deu voz de prisão”, conta Tolentino. As acusações que pesam sobre ele são de desobediência, resistência à prisão, dano ao patrimônio e lesão corporal.

Nesse momento, o advogado também deu voz de prisão à policial por abuso de autoridade. Contudo, a ação não foi concluída, segundo Tolentino, devido à falta de meios para exercê-la. Tal fato será investigado.

Já o advogado, porém, disse que agentes da Polícia Civil que estavam presentes, imediatamente se aproximaram dele e tentaram algemá-lo. Ele disse que entraria em contato com a OAB. “Eu peguei o celular do meu bolso, um dos agentes tirou o celular da minha mão. Quando eu fui pegar o meu celular da mão dele, todos voaram em cima de mim”, diz.

O embate físico foi iniciado e, segundo afirma Tolentino, ele foi agredido. Em determinado momento, um dos agentes teria tentado usar spray de pimenta, tendo sido impedido pelo advogado. “Me espancaram”, alega. “Eles me jogaram no chão, me algemaram, pisaram na minha cabeça. Eu não dei um soco em nenhum agente, eu só fiquei tentando me desvencilhar deles me imobilizando, porque eu vi que a prisão era ilegal. Eu queria ter ligado para a OAB”, afirma em sua versão dos fatos.

Após imobilizado, Gabriel Tolentino foi levado para a cela, onde permaneceu por cerca de meia hora. No local, ele alega ter solicitado aos agentes um copo d'água e o direito de realizar uma ligação (a qual teria sido feita à OAB). Ambos os pedidos foram negados, segundo ele.

Tolentino conta que teve sua liberação solicitada por outro advogado e que, após sair da cela, ficou por um tempo esperando pelos trâmites, como depoimentos. Ele foi liberado do local por volta de 00h30.

Polícia Civil emite nota

Procurada pela reportagem, a Polícia Civil, por meio de sua assessoria de comunicação, emitiu a seguinte nota sobre o caso:

“A Polícia Civil de Minas Gerais instaurou inquérito para apurar os crimes de desacato, desobediência e resistência à prisão por parte do advogado e as investigações seguem em andamento. Na ocasião, o advogado teria ficado agressivo e danificado alguns móveis da sala da Delegacia e foi necessário ser contido pelos investigadores. Também foi instaurado inquérito para verificar a ação dos policiais civis no atendimento ao advogado na Delegacia de Trânsito de Sete Lagoas. O procedimento é acompanhado pela Corregedoria da Polícia Civil de Minas Gerais e o Ministério Público será comunicado sobre os procedimentos ainda hoje”.

OAB também se manifestou emitindo uma nota

A OAB, no início da noite de quinta-feira (08), emitiu nota na qual esclarece e repudia a ação policial lançada mão em face do advogado Gabriel Tolentino. Confira o documento na íntegra:

A 46ª SUBSEÇÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SETE LAGOAS – vem a público manifestar o devido esclarecimento, bem como o repúdio pelos fatos acontecidos no dia 07 de agosto de 2018, na Delegacia de Trânsito de Sete Lagoas, em face do Advogado Gabriel Tolentino, que estava no exercício da profissão.

A autoridade policial deu voz de prisão, em flagrante, ao Advogado Gabriel Tolentino por crime de Desacato, e em via de consequência, este deu voz de prisão por abuso de autoridade.

Registra-se que a Lei Federal nº 8.906/94, em seu artigo 7º, §3º, prevê que “o advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo do exercício da profissão, por crime inafiançável (...)”, sendo que o crime de Desacato é afiançável, não se enquadrando, pois, no mencionado artigo.

A partir disso, o Advogado foi enquadrado, no entendimento da autoridade, nos crimes de Desobediência, Resistência, Dano (artigo 163 CP) e Lesão Corporal, sendo encaminhado, de forma arbitrária, para uma cela.

A OAB SETE LAGOAS foi devidamente acionada, conforme prevê a Legislação vigente, sendo solicitado pela Comissão de prerrogativas a sua imediata retirada da cela, o que foi cumprido.

Os procedimentos formais foram realizados e, ao final, o Advogado foi liberado “nos termos do art. 7º, IV da Lei nº 8.906/1994”, conforme fundamentação da autoridade policial.

A OAB repudia de forma veemente o ocorrido, diante da total violação das prerrogativas do Advogado, além de ter comprometido a integridade física do mesmo, em um total afronte à Constituição Federal e à Lei Federal nº 8.906/94 (Estatuto OAB), uma vez que, como sabido, o (a) advogado (a) é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável no exercício da profissão.

Ainda, a OAB SETE LAGOAS não permitirá, em hipótese alguma, qualquer tipo de agressão contra advogado (a), seja ela física ou moral, em razão do exercício do seu mister.

Por fim, destaca-se que a ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL continuará trabalhando de forma intransigente na defesa das prerrogativas dos advogados.

Sete Lagoas, 08 de agosto de 2019."

Vinícius Augusto



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