A vereadora mais votada por Pompéu, na região central de Minas, Titia Chiba (PSB), foi vítima de transfobia durante uma sessão plenária extraordinária da Câmara Municipal da cidade. O fato aconteceu na quinta-feira (23/2). Em vídeo que mostra a sessão Legislativa, o presidente da Casa, Normando José Duarte (PSD) repetidamente se refere à vereadora com pronomes masculinos, chamando-a de “senhor”, mesmo após ter sido corrigido pela colega. Em certo momento da discussão, aos gritos, ele continua usando a determinação errada e Chiba, também exaltada, repreende o colega vereador e pede para que seja chamada com os pronomes femininos. Na quinta-feira (2/3), uma denúncia foi apresentada por Titia Chiba junto à procuradoria da Câmara.
A confusão foi parar na delegacia, e um boletim de ocorrência contra o vereador foi registrado. Nele, os policiais responsáveis indicam o crime de “homofobia”, que, apesar de não ser o termo para a violência sofrida, faz parte do guarda-chuva de crimes relacionadas à orientação sexual e diversidade de gênero. Com isso, o inquérito continuará investigando a conduta do vereador, na esfera criminal. Uma notícia-crime foi encaminhada ao Ministério dos Direitos Humanos, que também pode levar a uma investigação.
A partir da denúncia apresentada na Câmara, o vereador poderá sofrer penalizações administrativas, como abertura de processo por quebra de decoro parlamentar. Ainda, na esfera cível, a vereadora pode buscar recompensação por danos morais contra Duarte.
“Na sessão, o vereador queria que eu votasse a favor de um projeto, mas eu era contra. Pedi a palavra, e declarei meu voto. Entramos em um empasse, ele começou a gritar, eu também gritei com ele. Eu não ficaria calada. Nesse debate, ele começou a usar ‘senhor’ para se referir a mim. Quando repetiu, eu disse a ele: ‘é senhora’. Exigi respeito. Ele repetiu novamente. Não aceitaria jamais passar por essa violência, ainda mais dentro de uma Casa Legisladora para a qual foi eleita”, declara Chiba.
“Em nenhum momento ele quis vir a mim pedir desculpa. Já tem dois anos que transacionei, mas invariavelmente, deveriam me respeitar. Vem acontecendo desde o início do mandato. ‘O que ela está fazendo aqui?’, ouço nos corredores. Trouxe à Casa dois projetos de visibilidade LGBTQIA+, e pastores apareceram para tentar protestar minha presença. Eu não queria ser vista como ‘a escandalosa’, mas não estou aguentando mais. Se eu me calar, estarei calando a voz do povo. Fui a vereadora mais votada do município. As pessoas confiam em mim e no meu trabalho – Por isso incomoda. Vou aonde for para representar a minha minoria”, defendeu.
Normando José Duarte não comentou o incidente. A reportagem fez contatos diretos ao celular do acusado e também no gabinete do vereador, que não deu respostas. Por telefone, a assessoria de imprensa da Câmara Municipal de Pompéu informou, que não irá se manifestar sobre a denúncia mesmo que o fato tenha ocorrido durante a sessão plenária da Casa. Veja o vídeo:
Vereadora trans é vítima de transfobia na Câmara de Pompéu pic.twitter.com/STyRMAkkMi
— Sete Lagoas.com.br (@SeteLagoas) March 7, 2023
Transfobia é crime
A presidente da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e membro da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados de Minas Gerais (OAB-MG), Juliana Vieira Lobato, ressalta que qualquer agressão à identidade de gênero é crime.
“A questão da transfobia é absorvida no entendimento do que foi a homofobia, que foi equiparada ao crime de racismo por decisão do Superior Tribunal Federal (STF). A partir do momento que ela não foi vista a partir da identidade de gênero que tem, foi transfobia. Ainda, pode haver processos como quebra de decoro ou punições administrativas dentro da Casa, e pedido de indenização por ofensa moral”, detalha.
“Muita gente mistura a orientação sexual com o gênero. De forma simplificada, orientação é se a pessoa hétero, homossexual. O gênero entra na questão da transexualidade. Uma pessoa trans é como estivesse ‘no corpo errado’ em relação à identidade, e a partir do momento que a pessoa se identifica com um gênero, ela tem direito de retificá-lo em qualquer cartório. Ainda, de receber atenção especial no ambulatório trans do SUS, que dá suporte de psicanalistas, hormônios, psiquiatras. A uma agressão a essa identidade é crime, um absurdo. É possível via cartório adequar o nome social – e juridicamente a vereadora é mulher. Passa aceita e vista tal qual sempre se identificou”, completa.
A Rede Trans Brasil repudiou a transfobia ocorrida na Câmara de Pompéu em nota. “Rede Trans Brasil vem ao público se solidarizar com a vereadora Lunna da Silva, conhecida como Titia Chiba (PSB) pela transfobia sofrida no plenário da Câmara Municipal de Pompéu/MG e repudiar a fala do vereador e Presidente da Câmara o Sr. Normando José Duarte (PSD) que de forma hostil e constrangedora dirigiu-se a pessoa dela chamando-a de ‘senhor’ por diversas vezes, desrespeitando sua identidade de gênero e dignidade enquanto vereadora e mulher trans”, diz o texto.
Da Redação com Otempo