Um dos pedidos mais recorrentes dos criminosos que atacaram prédios públicos em Brasília no domingo (8) é a apresentação do código-fonte das urnas eletrônicas. Segundo eles, ali seria possível confirmar quem venceu a eleição — embora Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já tenha sido reconhecido por todas as instituições nacionais e internacionais como presidente eleito.
O código-fonte é o conjunto de instruções que permitem que um sistema funcione. Ele é escrito em uma linguagem compreensível para programadores, ou seja, quem conhece uma determinada linguagem é capaz de entender as instruções escritas ali. Esse software informa ao equipamento como ele deve funcionar e é imutável.
Talvez os vândalos não saibam, mas, no Brasil, a abertura do código-fonte da urna eletrônica é uma das etapas obrigatórias realizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante o processo eleitoral. Isso é necessário para que ele seja avaliado por especialistas, que ajudam a saber se o software vai operar corretamente ou se tem alguma falha de programação.
Para as Eleições 2022, o código-fonte das urnas eletrônicas ficou disponível por um ano, desde outubro de 2021 (até as eleições anteriores, esse prazo era de seis meses). Qualquer entidade fiscalizadora, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Polícia Federal (PF), universidades e partidos políticos, têm acesso ao software nesse período.
Durante a análise, é possível verificar todas as operações que a urna eletrônica pode executar. Em outras palavras, é possível compreender como os votos são coletados, armazenados e apurados. Arthur Igreja, especialista em tecnologia e inovação, diz que o argumento de que o código-fonte poderia ter sido analisado antes não é aceito pelos invasores porque não ajuda a sustentar o que eles querem argumentar. “Não buscam fatos nem participam do processo antes para deixar preparado um caminho para justificar alguma coisa.”
Registro de votos
Como esse conjunto de instruções é imutável, os votos não são registrados nele. Essas informações são armazenadas nas mídias de resultado e, depois, transmitidas para o TSE. Elas são enviadas para totalização por meio de uma rede privada virtual (VPN), que se conecta à rede privada da Justiça Eleitoral. Tanto a transmissão quanto a totalização são auditáveis.
Ou seja, o pedido dos criminosos que atacaram Brasília não tem sentido. Além de ter ficado disponível por um ano para verificação de qualquer interessado e ter sido avaliado por representantes do Ministério da Defesa e das Forças Armadas em agosto de 2022, dois meses antes do primeiro turno das Eleições 2022, o código-fonte não tem a informação que eles buscam.
Por que, então, esse pedido tem sido feito de forma recorrente desde a confirmação da vitória de Lula no segundo turno? Para o especialista Igreja, esse é um argumento que se autovalida. “É uma questão de retórica, de não se usar a evidência, os fatos, e, sim, acomodar os argumentos em função daquilo que se quer provar”, aponta. “Se você vence, usa o argumento de que funcionou. Se perde, diz que houve uma falha.”
Ele destaca que o código-fonte obviamente não mostra o nome do vencedor — já que o software não é alterado pela inserção dos votos. “A partir do momento que alguém edita um print ou o pedaço de texto, isso já é suficiente para que uma horda acredite naquilo e, pronto, já está estabelecido. Hoje, basicamente, qualquer tipo de argumento, por mais fantasioso que seja, é aceito como verdade, em uma mistura de fanatismo e alucinação coletiva.”
Com Itatiaia