Em setembro, o Setembro Amarelo promoveu a mensagem “Se precisar, peça ajuda!” para combater o estigma do autoextermínio e valorizar a vida. Alarmantes dados da Secretaria de Vigilância em Saúde revelaram aumentos significativos nas taxas de autoextermínio entre adolescentes no Brasil, destacando a necessidade contínua de conscientização e apoio à saúde mental. Nossa redação teve a oportunidade de entrevistar a psicóloga Ellen Braga, que compartilhou insights valiosos sobre a importância de cuidar da saúde mental e abordou questões críticas relacionadas ao tema.
- Sinais de alerta mais comuns e os estigmas em torno da saúde mental
Ellen Braga ressaltou que a saúde mental é um conceito complexo e que cada pessoa vive experiências de prazer e desprazer ao longo da vida, tornando-a única. No entanto, ela mencionou alguns indícios que podem indicar problemas de saúde mental, como dificuldades em manter rotinas, diminuição de hábitos de autocuidado, isolamento social e alterações nos processos psicológicos básicos, como pensamento, linguagem, atenção, humor e memória.
A psicóloga também enfatizou que o estigma em relação à saúde mental está enraizado em valores culturais e interesses políticos e econômicos. “Ao olhar para a história assistencialista às pessoas em sofrimento mental, quer seja no mundo e de modo semelhante no Brasil (com suas especificidades), constata-se que os diagnósticos de transtornos mentais serviram para a perpetuação de concepções capacitistas, portanto, discriminatórias e violentas; muitas delas pautadas em visões religiosas, moralistas e científicas (eugenia).”
Ela destacou a importância de trazer essas questões para os debates de forma honesta e comprometida com a vida humana. Além disso, ela mencionou a necessidade de construir meios de acolhimento para aqueles que precisam de ajuda e de lutar. “Para tanto, é necessário o engajamento social nas esferas públicas e privadas; bem como lutar por políticas públicas que democratizem o acesso a serviços e viabilizem condições dignas de sobrevivência à população brasileira”, concluiu.
- Setembro Amarelo
Ellen argumentou que a campanha Setembro Amarelo é importante, mas é necessário um esforço contínuo para que as ações não se limitem a um mês. Ela defendeu que a promoção da saúde mental envolve a reflexão sobre como a sociedade trata questões emocionais e a busca por meios de reconhecer e lidar com essas questões de maneira saudável.
“É importante também convocar autoridades para um posicionamento comprometido com a vida humana, bem como exigir a criação e realização de políticas públicas que efetivem práticas de prevenção e tratamentos adequados. De modo geral, o modo como uma pessoa considera os aspectos emocionais diz de como lidará com as questões das outras pessoas, logo, para que haja acolhimento é preciso antes haver reconhecimento social.”
- COVID-19 e a saúde mental
A pandemia da COVID-19 trouxe uma realidade difícil para muitas pessoas, levando a um aumento do estresse, da angústia e do adoecimento mental, observou Ellen. “O cenário pandêmico ressaltou que a vida em comum é a possibilidade de permanecer vivo e que, para lidar com os desafios inerentes à condição humana, é interessante construir saídas coletivas de cooperação.”
- O Papel da psicoterapia e psicologia
A psicóloga destacou que os profissionais da Psicologia devem atuar alinhados aos princípios dos direitos humanos e trabalhar para a equidade e justiça social. “Logo, devem se posicionar contra ações discriminatórias de raça, gênero, orientação sexual, deficiências, etnias, dentre outras, e estar sensíveis às demandas que circundam o direito à vida humana”, destacou ela.
- Saúde Mental e pessoas masculinas
Ellen argumentou que o alto índice de suicídio entre homens pode ser atribuído à não validação social de hábitos de autocuidado e de expressão das emoções para as pessoas do sexo masculino. “Estereótipos que concebem masculino como sinônimo de fortaleza, valentia e baixa sensibilidade inibem ou mesmo impossibilitam que essas pessoas expressem seus sentimentos e emoções, condição esta para um adoecimento mental-físico”.
Ela ainda recomenda o documentário “O Silêncio dos Homens” de 2019, que explora essa temática de forma mais contundente.
- A importância da rede de apoio para desmistificar os mitos sobre a saúde mental
A importância de construir uma rede de apoio e cooperação também foi ressaltada. Amigos, familiares e pessoas próximas podem contribuir para a promoção da saúde mental. “Isso acontece quando eles se reúnem para dividir tarefas e compartilhar dificuldades e conquistas, se respeitam, reconhecem os desafios e entendem que a contribuição de cada um favorece o coletivo”.
No entanto, ela também alertou sobre a influência do individualismo na sociedade moderna, que pode dificultar o reconhecimento das necessidades de ajuda, e mencionou a importância de não considerar a saúde mental como responsabilidade exclusiva da pessoa afetada.
“As experiências humanas são plurais, e os fenômenos que caracterizam um transtorno também são. Isto é, o que leva ao adoecimento, como este se manifesta e como será considerado está diretamente relacionado à história singular da pessoa e ao contexto socioambiental em que vive”.
Ela também destacou que os transtornos mentais não se resumem a “loucura” e que suas manifestações variam de acordo com a história de vida e o contexto de cada pessoa.
- Táticas para cultivar uma saúde mental equilibrada
Para aqueles que enfrentam dificuldades significativas em suas vidas, ela recomendou buscar ajuda conversando com amigos, familiares e profissionais de saúde. Ela mencionou serviços públicos de prevenção e promoção de saúde, como as Estratégias de Saúde da Família (ESF) e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Além disso, ela destacou a disponibilidade do Centro de Valorização à Vida (CVV) para apoio gratuito por meio de diferentes canais.
Ellen enfatizou a importância de fatores como estilo de vida saudável, alimentação equilibrada, sono adequado, atividade física e relações sociais positivas.
A psicóloga também alertou para os impactos das mídias sociais e da tecnologia na saúde mental e recomendou uma abordagem equilibrada. Ela aconselhou as pessoas a refletirem sobre como o uso dessas tecnologias afeta suas vidas e a buscarem um equilíbrio saudável no uso delas, evitando o excesso e promovendo relações sociais reais.
Ellen Braga mencionou que terapias alternativas, como a meditação e a acupuntura, podem desempenhar um papel positivo na promoção da saúde mental. No entanto, ela recomendou que as pessoas considerem integrar essas práticas em sua abordagem de cuidados com a saúde mental sempre em consulta com profissionais de saúde.
Da redação, Djhessica Monteiro.