Ao escrever o livro As Leis, em 437 a.C., o filósofo Platão sustentou a tese de que a governança ou a condução do Estado deveria ficar a cargo dos sábios, cabendo aos ignorantes apenas segui-los. Esse era o pressuposto fundamental de sua teoria política.

Em síntese, Platão centralizava toda a sua reflexão política em uma única pergunta: quem deve governar o Estado? A partir dessa proposição ideológica, Platão problematizou um tema que permanece presente no debate político até os dias atuais.
Pois bem, diante dessa pergunta, é natural que diferentes grupos sociais apresentem respostas variadas, tais como: “os mais sábios”, “o estadista”, “os capitalistas”, “os trabalhadores” ou “o povo”. Outros podem responder: “a vontade geral”, “a esquerda”, “a direita”, “o centro” ou, até mesmo, “o ditador”.
Na atualidade, discute-se a necessidade de superar a polarização entre esquerda, direita e centro, em busca de uma “terceira via” para promover a governança do Estado.
No entanto, essa “terceira via” também representa uma vertente ideológica, inserida nos pressupostos ideológicos formulados por Platão. Ou seja, a tese da necessidade de uma “terceira via” como vertente política, assim como a direita, a esquerda ou o centro, não consegue afastar a questão central do debate ideológico: quem deve governar o Estado?
Isso demonstra que, mesmo no século XXI, as teses de Platão permanecem sólidas e influentes no debate político contemporâneo. Foi essa mesma premissa que, ao longo da história, gerou divergências infindáveis e cisões políticas prejudiciais à humanidade.
Contudo, poucos percebem que a questão central da teoria política não deveria ser “quem deve governar o Estado”, mas sim “como podemos organizar as instituições políticas de modo que os governantes, sejam eles bons, maus ou incompetentes, possam ser impedidos de causar demasiados danos”. Essa deveria ser a premissa central do debate político nas democracias modernas.
A razão para isso é simples: embora devamos sempre buscar o melhor em política, é fundamental estar preparado para o pior. O ambiente político é marcado pela sedução, pelos interesses, pela retórica e pela persuasão, permitindo que “lobos” se disfarcem de políticos caridosos, bondosos, sábios ou, em alguns casos, ditadores.
A tese do controle do poder por meio das instituições políticas pressupõe que um sistema de governo será verdadeiramente democrático quando permitir que o povo destitua seus governantes sem a necessidade de derramamento de sangue. Para isso, é essencial que as instituições estatais garantam eleições regulares, permitindo que os governantes sejam substituídos de forma pacífica. No entanto, a democracia não se resume apenas à realização de eleições.
Em uma democracia, o mais importante é que as instituições democráticas estejam vinculadas à resolução de problemas concretos que afetam a implantação de uma vida digna para todos, garantindo direitos fundamentais. Dessa forma, não importa a vertente ideológica ou o rótulo do governante. O que realmente importa, em uma democracia plena, é sua capacidade de explicitar, de maneira objetiva, como sua governança pretende utilizar as instituições governamentais para promover, ainda que gradativamente, uma vida digna para todos.