Está cada vez mais comum receber ensinamentos de coaches, líderes e “papagaios” das redes sociais sobre como o futuro da gestão, pública ou privada, está na tomada de decisões baseada em dados (data driven). Ocorre que essa confiança inabalável nos dados não considera quantas vezes a realidade fática ou o próprio sistema podem estar distorcidos na produção desses mesmos dados, que servem como base para a tomada de decisão.

Ora, apesar da ampla quantidade de dados e informações, muitas vezes obtidas com o auxílio da inteligência artificial, não podemos afastar a tese de que “toda tomada de decisão é produzida com forte carga de incerteza”. Em outras palavras, jamais podemos ter certeza absoluta de que uma decisão está imune a falhas ou distorções advindas da realidade objetiva.
É fato que uma análise mais detalhada dos dados pode reduzir as incertezas e tornar o processo decisório um pouco mais assertivo. Entretanto, é preciso reconhecer que nem sempre os dados produzidos foram gerados a partir de premissas previamente testadas para evitar danos irreparáveis. Daí a importância de conhecer o paradoxo do Cisne Negro, explicitado por Karl Popper, que alerta sobre o risco de assumir que a repetição de informações sobre determinado fato ou tema é suficiente para garantir uma decisão segura.
Muitas organizações, públicas e privadas, estruturam seus dados, criam sistemas de análise, capacitam profissionais e adotam dashboards em tempo real, tudo isso para garantir que as decisões sejam tomadas com base em evidências. Contudo, o grande perigo está na crença de que os dados produzidos em grande escala são capazes de prever um futuro possível de maneira confiável.
O fato é que a decisão humana, ainda que baseada em dados, é sempre limitada e falível. Essa observação foi claramente ilustrada pelo paradoxo do Cisne Negro, influenciada pela ideia de falsificabilidade de Karl Popper. A tese é simples: durante muito tempo, acreditava-se que todos os cisnes eram brancos, pois nunca se havia observado um cisne negro no planeta Terra. Contudo, em uma expedição à Austrália, descobriu-se a existência de um cisne negro. Ou seja, bastou a descoberta de uma única evidência contrária para desmontar a crença estabelecida de que a repetição de informações advindas da realidade objetiva poderia gerar um grau de certeza inquebrantável.
Essa premissa se aplica diretamente à tomada de decisão baseada em dados, pois os padrões que identificamos só existem porque ainda não encontramos exceções. Por essa razão, confiar cegamente nos dados, sem um controle racional (racionalismo crítico), pode nos levar a surpresas e danos irreparáveis.
Empresas que dependem excessivamente de modelos analíticos podem ser pegas de surpresa por eventos atípicos que não estavam contemplados na base histórica de uma sequência objetiva de dados. Isso significa que, por mais sofisticados que sejam os processos de análise, sempre haverá um grau de incerteza na tomada de decisão.
Logo, a incerteza é inerente a qualquer processo decisório. Conforme ensina Ilya Prigogine em seu livro O Fim das Certezas, mesmo os sistemas mais complexos estão sujeitos a fatores imprevisíveis, e a ilusão da previsibilidade é um dos maiores erros da ciência e da gestão empresarial.
Os dados podem indicar um caminho seguro apenas até certo ponto. A própria natureza da realidade é probabilística e não determinística. Ou seja, mesmo diante dos melhores modelos matemáticos e estatísticos, eles não são capazes de prever todas as variáveis possíveis da realidade objetiva. Isso reforça a necessidade de enxergar os dados como ferramentas, e não como verdades absolutas.
Em síntese, o paradoxo do Cisne Negro e O Fim das Certezas, de Ilya Prigogine, ensinam que, se o gestor, público ou privado, não tiver capacidade intelectiva para questionar os dados advindos da realidade fática, a possibilidade de danos irreparáveis será inevitável.
Os dados, repito, são valiosos e permitem uma tomada de decisão mais embasada, mas jamais devemos considerá-los infalíveis. A razão humana, assim como os dados, está sujeita a falhas. Por isso, o capital mais valioso nos próximos séculos, sobretudo em tempos de inteligência artificial, não serão as máquinas, mas sim as pessoas com intelecto crítico, capacitadas e formadas para questionar os fatos e os dados disponibilizados artificialmente.
Precisamos estar preparados para o inesperado, pois a confiança exagerada nas decisões baseadas em dados pode nos impedir de enxergar a possibilidade da existência de um Cisne Negro diante da crença cega na previsibilidade. Portanto, o grande desafio da inteligência humana está na capacidade de adaptação e crítica constante sobre nossas próprias ações, tanto na tomada de decisões pessoais quanto nas corporativas.