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Conheça a história da brasileira que mesmo sem ter o movimento dos braços realizou o sonho de virar maquiadora

Desde criança, a mineira Clélia Rodrigues demonstrava habilidade com atividades ditas "manuais": escrever, colocar a linha na agulha, desenhar…

Clélia aprendeu a rotina da beleza com a mãe — Foto: Arquivo pessoalClélia aprendeu a rotina da beleza com a mãe — Foto: Arquivo pessoal

Só que tem um detalhe: ela não usa as mãos. Não porque não as tem, mas devido a uma condição que a faz não conseguir movimentar os braços. Muito do que normalmente se faz com a mão, Clélia, hoje com 27 anos, faz com a boca.

Na escola da pequena Teixeiras (MG), ela lembra que era sempre uma das primeiras a terminar de copiar o quadro nas folhas do caderno. Cozinhar sempre foi um prazer — e, apesar de que cortar legumes e carnes seja uma tarefa mais árdua para ela do que para quem usa as mãos, ela está sempre na cozinha testando receitas para o marido e a filha.

Mas foi outra paixão que virou profissão: a maquiagem.

"Seu trabalho é incrível, arrasa demais", comentam seguidores de Clélia.

Um vídeo postado por ela no TikTok teve mais de 4,6 milhões de visualizações. O desafio era mostrar o contraste entre a vida pessoal e profissional.

Com sua dificuldade para andar, a maquiadora vem caminhando pelo corredor de casa em direção à câmera: "Essa sou eu". Logo, mostra o trabalho com maquiagem: "Isso é o que eu faço", arrancando elogios.

O diagnóstico de artrogripose

Há 27 anos, Clélia nasceu com contraturas em diversas articulações pelo corpo – as pernas, levantadas para cima, eram grudadas na cintura; os pés ficavam em contato com as orelhas; e os braços ficavam sempre para baixo, sem movimento.

O diagnóstico foi de artrogripose congênita múltipla. Como explica o ortopedista pediátrico Rafael Yoshida, da AACD e membro da Sociedade Brasileira de Ortopedia, não se trata de uma "doença" mas sim um "sinal clínico" de outros problemas de saúde.

A manifestação mais clássica é a amioplasia, que pode comprometer membros superiores e inferiores, mas sem alterações neurológicas. Ao todo, são mais de 400 patologias que podem estar associadas à artrogripose, sendo cerca de 150 delas de causa genética. Doenças maternas, falta de espaço no útero e síndromes neurológicas também podem estar por trás das contraturas.

"É importante saber a origem, porque dependendo da patologia há causas que podem ser corrigidas", diz Yoshida. Hoje, dependendo da situação, como a malformação da medula espinhal, já existem cirurgias intra-uterinas.

No interior de Minas Gerais, Clélia nunca chegou a descobrir o que causou a deficiência.

Ainda nos primeiros meses de vida, ela fez cirurgias para corrigir a posição das pernas. Mas os médicos não acreditaram que ela poderia, um dia, andar.

A mineira também chegou a ser levada para instituições que recebem crianças com deficiência mental, onde passou por tratamento nas pernas que, lembra, era muito doloroso. "Eu sinto a tortura até hoje"

"O cognitivo desses pacientes muitas vezes é normal, se a causa da artrogripose não foi neurológica. Erroneamente, as pessoas taxam essas patologias que levam a malformações a alguma deficiência intelectual", ressalta o médico Rafael Yoshida.

Aos 6 anos, Clélia começou a andar – e hoje, apesar de ter dificuldade para percorrer distâncias longas, consegue até subir escadas.

Nessa mesma época, passou a frequentar a escola de Teixeiras, com suporte dos funcionários e colegas, que empilhavam mochilas em frente à cadeira dela para que pudesse apoiar as pernas, que não dobram:

"Eu era a primeira a acabar tudo, escrevendo com a boca. Nem lembro quando comecei a fazer coisas assim, foi algo natural do meu corpo", lembra.

No último ano do ensino médio, Clélia sofreu uma queda em casa e machucou a perna. Não pôde, assim, frequentar as aulas e fazer as provas. Acabou reprovada e abandonou o colégio. Mas ela ainda tem o sonho de concluir os estudos e buscar uma faculdade de psicologia, a segunda paixão na sua vida, depois da maquiagem.

Com vídeos nas redes sociais, a mineira ganhou cursos e acumulou seguidores — Foto: Arquivo pessoalCom vídeos nas redes sociais, a mineira ganhou cursos e acumulou seguidores — Foto: Arquivo pessoal

Profissão: maquiadora

Clélia sempre viu de perto como funciona a rotina da beleza, especialmente de mulheres. A mãe, Rita, fazia cabelos, maquiagem e pintava unhas na casa de clientes e em salões de Teixeiras e, depois, de Visconde do Rio Branco (MG), para onde se mudou.

Quieta e sentada, enquanto a mãe atendia as clientes, a pequena Clélia notava o bem que os cuidados com a beleza faziam àquelas mulheres.

"Achava lindo elas saírem felizes porque estavam mais bonitas e ver como aquilo era importante para a autoestima".

Por volta dos 15 anos, com a vaidade da juventude mais aflorada, Clélia usou a expertise dos salões para maquiar as amigas "até para ir na padaria": "Elas nem estranharam [maquiar com a boca], porque elas já sabiam que eu fazia as coisas assim".

Até os 24, a atividade continuou só como hobby. Foi quando percebeu que podia, como qualquer outra maquiadora que usa as mãos, trabalhar profissionalmente com maquiagem.

Os primeiros testes foram com clientes apresentadas pela mãe. Depois, passou a postar vídeos no YouTube e Facebook.

Em alguns, com o pincel fixo na penteadeira e movimentando a cabeça, ela conseguia fazer a própria maquiagem. Em outros, mostrava a rotina em casa e a técnica usada nas clientes.

Os vídeos não chegavam a repercutir tanto, mas foram suficientes para Clélia receber convites de maquiadoras profissionais para fazer cursos e workshops.

Para trabalhar, a mineira usa adaptações: para não ter contato com a boca, a esponja é colocada no fim de algum cabo comprido. Já o batom é retirado do recipiente tradicional e aplicado com um pincel. Coisas que precisam ser feitas com a mão, como passar um creme ou puxar o olho para passar o lápis, ela pede a ajuda das clientes.

"Me adapto do jeito que posso e não fico pensando 'ai, eu não consigo'".

Quando o trabalho começou a engrenar, porém, veio a surpresa: Clélia estava grávida do marido, Lucas, com quem havia se casado 2 anos antes. Um remédio para emagrecer acabou cortando o efeito do anticoncepcional.

"Foi um milagre. A gente tinha combinado de adotar, porque eu não teria condições, pelo meu corpo, de carregar uma barriga com uma criança."

Mas Clélia carregou. Passou os 9 meses de repouso, sem trabalhar, já que o peso era muito grande para seus pés.

Yasmin nasceu no início de 2020, pouco antes da pandemia. Os planos de Clélia para voltar a maquiar foram suspensos – como ela usa a boca (portanto, sem poder vestir máscaras) e o contato é muito próximo das clientes, não podia colocá-las em risco.

Enquanto o coronavírus não dá trégua, Clélia aprendeu novas ferramentas, dessa vez nas redes sociais.

Usando o nariz, ela escreve e edita os próprios vídeos, como os que foram parar no TikTok, rede onde já tem mais de 200 mil seguidores.

Os novos vídeos são feitos com a mãe ou com uma funcionária que a ajuda em algumas tarefas de casa que exigem o uso das mãos, como carregar a filha bebê, tomar banho e trocar de roupa.

Quando a pandemia passar, ela espera colher os frutos da "fama" repentina: "Meu sonho é dar palestras sobre maquiagem. Não só contar técnicas, quero contar minha história, para inspirar que todos podem ser o que quiser".

Com Vitor Tavarez - BBC

 



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